Com
menos aliados e sob o risco de ficar sem Lula, PT faz ofensiva por apoio
popular
Partido se volta a
movimentos sociais e militância e flerta com ala evangélica.
Ex-presidente vive
paradoxo: é o mais bem colocado nas pesquisas e o mais ameaçado
TALITA BEDINELLI
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Lula em ato no Rio de
Janeiro. RICARDO MORAES REUTERS.
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A notícia desta semana de
que o ex-presidente Lula será julgado no dia 24 de janeiro pelo Tribunal
Regional Eleitoral da 4ª Região (TRF4), em segunda instância, derrubou o ânimo
de petistas graúdos.
A possibilidade de Lula se tornar inelegível oito meses
antes da eleição, balançou as estruturas no partido que já vinha empregando
esforços para reorganizar-se depois do caos que começou em 2014, com a Lava
Jato.
Se por um lado o seu possível candidato tem a maior preferência entre os
eleitores, por outro pode ser impossibilitado de seguir adiante.
Antes desta
batalha, porém, a legenda entrava na disputa por 2018 sob um desalento que
antecedia a eventual saída de seu protagonista.
As alianças partidárias que deram
sustentação à legenda nas últimas eleições minguaram, com a saída, inclusive,
do sempre aliado PCdoB.
E o suporte nas ruas quase desapareceu ao longo dos
anos em que o Governo esteve em mãos petistas, com a ida de importantes quadros
de articulação para a administração do país e a insatisfação dos movimentos
sociais e da militância com algumas das políticas adotadas neste período.
Sabendo da dificuldade de se reconquistar aliados, já que muitos dos antigos
correligionários se juntaram ao atual Governo, o partido foca em tentar
recuperar militantes.
Nos últimos meses, o PT já
tentava se reaproximar das ruas, com uma nova campanha de filiação, a mudança
dos quadros que fazem o contato com os grupos e a tentativa de organização em
segmentos em que antes não eram organizados, como os evangélicos.
Nesta sexta
dia 15, por exemplo, o partido lançou um grupo de comitês populares para
articular movimentos sociais, sindicais e a militância petista pela defesa da
candidatura de Lula nas ruas.
“Estamos a favor da democracia. Estamos com
Lula”.
Depois de o TRF-4 ter
marcado a data do julgamento de Lula — o ex-presidente prometeu nesta quarta
"brigar até as últimas consequências".
"Queremos iniciar uma campanha massiva,
de criação de comitês populares, por local de trabalho, em defesa do direito de
Lula ser candidato à presidente da República", explica o texto de
lançamento da iniciativa, assinado pela atual presidenta da sigla, a senadora
Gleisi Hoffmann, e pelo secretário de Movimentos Populares e Políticas
Setoriais do PT, Ivan Alex Lima.
No final de setembro, o
partido também renovou a liderança de suas 27 secretarias setoriais, que
funcionam como coordenadorias temáticas que lidam com grupos específicos, como
cultura, juventude, combate ao racismo.
E, com o afastamento do poder, nomes
estrelados acabaram responsáveis por alguns destes núcleos, como é o caso do
ex-ministro do Desenvolvimento Agrário na última gestão de Rousseff, Patrus
Ananias, que assumiu a Secretaria Setorial Nacional Agrária do PT, responsável
pelas propostas do partido para este segmento.
"Há quatro anos a gente
não fazia este tipo de renovação", explica Gleisi Hoffmann.
"De fato,
houve um pouco de afastamento entre os movimentos sociais e o PT nos últimos
anos com a presença do partido no Governo e queremos reforçar essa nossa
proximidade", reconhece ela, que pondera que isso não quer dizer que a
legenda tenha se "distanciado" destes grupos, pois "muitas das
políticas públicas foram planejadas em cima das demandas dos movimentos
sociais".
Mas o próprio ex-presidente Lula já havia reconhecido o problema
no aniversário de 35 anos do PT, no início de 2015:
"O exercício do poder
acaba fragilizando um partido", afirmou, na ocasião, cerca de um ano antes
de Dilma Rousseff sofrer o impeachment que alijou o partido do poder federal,
local que ocupava havia 13 anos.
"[Os militantes] ao invés de irem para a
porta da fábrica, foram para repartições públicas", destacou ele.
"A direção do PT ficou
quatro anos sem falar com o MST [Movimento dos Sem-Terra] nos últimos períodos
do Governo Lula.
A gente simplesmente não conseguia falar com o
presidente", explica o agricultor João Paulo Rodrigues, coordenador
nacional do movimento, um dos mais próximos ao partido antes de a legenda
assumir o poder.
"Quando o PT
estava na Presidência houve muita oscilação política em relação aos movimentos
sociais.
O partido fez alianças críticas, com pessoas como o [José] Sarney, com
setores do agronegócio", explica ele, que reconhece que, agora, o
movimento volta a se aproximar.
"Os golpistas querem tirar o direito de
Lula ser candidato.
Temos problemas maiores.
Quando se está perdendo tem que se
unir.
O Lula tem que ser candidato, mas isso não significa que vamos apoiar
necessariamente os governadores e prefeitos do PT", pondera ele, que
promete que o MST colocará a militância na rua em apoio ao ex-presidente.
"A realidade se
transformou.
E as bases políticas que formavam aquela aliança que levou o PT ao
poder já não existem mais naquele formato.
Essas bases agora terão que ser
outras", afirma Ricardo Gebrin, um dos diretores nacionais da Consulta Popular,
grupo que reúne militantes de diversos movimentos de esquerda que também
realizou críticas públicas ao Partido dos
Trabalhadores nos últimos anos, mas
recentemente declarou apoio a Lula.
"Temos elementos de crítica no que
foram as experiências de Governo petistas.
Elas trouxeram lacunas importantes,
como a falta de organização popular ou não ter buscado caminhos para romper com
o sistema político vigente", diz ele.
"Mas o candidato Lula
transcende o PT.
É um elemento contra o golpe, um símbolo da esperança e que
tem potencial político.
Temos que apostar nesta aproximação com os
movimentos", explica.
Para o coordenador da
secretaria do partido que faz a interlocução com os movimentos populares, Ivan
Alex Lima, o PT agora se volta ao que fez em sua construção, na década de 80.
"Se vamos apresentar um novo programa agrário para as eleições não temos
como não ouvir os movimentos agrários", explica ele.
"O mesmo
acontece na educação, na mídia...
Se olharmos os últimos 10 anos, essa não foi
a chave.
Quando se chega ao Governo há esse efeito colateral em que a
burocracia ganha força."
Evangélicos
Diante da falta de apoio
iminente de líderes evangélicos a uma candidatura lulista, o PT também tem
buscado se organizar na base desta religião, que já aglutina 32% da população,
segundo pesquisa Datafolha.
A responsável pelo trabalho é a deputada federal
Benedita da Silva, evangélica pentecostal, que tem organizado os militantes e
simpatizantes petistas em torno da causa.
Ela nega, entretanto, que isso esteja
sendo feito por interesse eleitoral.
"O PT tem muitos evangélicos e me
incomoda muito quando dizem que somos todos iguais", explica ela, que diz
ser contrária a postura de parlamentares evangélicos conservadores de
dificultar a união de casais do mesmo sexo e do acesso ao aborto em caso de
estupro, algo já garantido pela legislação.
"Estamos relendo os nossos
princípios como evangélicos e dando contribuições de forma partidária.
Discutindo, por exemplo, o que significa para nós o acesso à terra, à educação,
à saúde.
Não posso, por exemplo, ser a favor desta reforma da Previdência se
minha fé diz que é um dever da gente cuidar dos nossos idosos, das nossas
viúvas".
Segundo ela, será lançado um
manifesto nos próximos meses e haverá um encontro nacional só dos petistas evangélicos.
"O partido nunca se preocupou muito com essa questão.
Mas nossa
preocupação não é a de buscar evangélicos para o PT.
Sentimos que é nosso dever
demonstrar para o povo as várias visões que os evangélicos têm.
Precisamos
reagir diante das coisas escabrosas que estão acontecendo", explica.
"É um debate muito sério, rico e humano.
Estamos fazendo a discussão.
É
claro que se as pessoas quiserem vir conosco, ótimo!"
post: Marcelo Ferla
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