Estudo aponta aumento de
racismo nos estádios brasileiros.
Giovanni Magliano
O relógio já havia passado
dos 40 minutos do primeiro jogo entre Santos e Grêmio pelas oitavas de final da
Copa do Brasil de 2014 quando Aranha, goleiro da equipe paulista na época, não
conseguiu mais se controlar e denunciou os xingamentos racistas que escutava
vindos da torcida gaúcha.
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Grêmio é excluído da Copa
do Brasil por racismo a Aranha
Foto: Reprodução
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Apesar das chamativas
gesticulações do arqueiro, o árbitro não registrou nada na súmula da partida.
"Começaram a me chamar de 'preto fedido', gritar 'cambada de preto'.
Apesar de ficar nervoso, me segurei, mas aí começou o coro de macaco",
contou Aranha na saída do campo.
O caso ganhou enorme
repercussão e as autoridades agiram à altura.
Com reveladores flagras das
câmeras de televisão, torcedores foram identificados, o Supremo Tribunal de
Justiça Desportiva (STJD) excluiu o Grêmio da Copa do Brasil daquele ano e o
árbitro levou um gancho por não ter registrado o caso.
Mais de dois anos já se
passaram desde o episódio e há sinais de que o país regrediu no combate ao
racismo no esporte.
O Relatório Anual da Discriminação Racial no Futebol de
2015, feito pelo Observatório da Discriminação Racial no Futebol em conjunto
com a Universidade Federal do Rio Grande do Sul, lançado na última
segunda-feira, indica um aumento de 20% de casos de discriminação racial dentro
de estádios de futebol entre 2014 e 2015.
Para Maurício Corrêa da
Veiga, secretário da Comissão de Direito Desportivo da OAB e que colaborou com
a elaboração do documento, existem diversos elementos que podem explicar esse
crescimento, mas um se destaca.
"A sensação de impunidade talvez seja o
mais convincente e racional", apontou em contato com a Gazeta Esportiva.
No ano de 2014, foram
contabilizados 20 supostos casos de racismo.
No ano seguinte, esse número subiu
para 24 casos.
As estatísticas mostraram uma situação extremamente delicada no
Rio Grande do Sul, onde aconteceu o episódio com Aranha em 2014, que teve um
crescimento de 80% de ocorrências.
Ao todo, nove estados registraram algum caso
de incidente racial no ano passado.
Uma das questões que podem
explicar esses números são a falta de atuação dos órgãos que deveriam coibir
essas atitudes.
Corrêa da Veiga indicou que falta mais atuação dos tribunais
regionais.
Nos campeonatos estaduais, os julgamentos de primeira instância são
de competência do órgão das respectivas federações.
"Pode acontecer dos
processos nem chegarem ao STJD", alertou o advogado.
O STJD tem
competência direta apenas sobre os torneios nacionais.
O estudo do Observatório
afirmou que existiram cinco possíveis casos de racismo em 2015, registrados nas
súmulas dos respectivos jogos, cujas denúncias não foram levadas adiante. Três
ocorreram em âmbito estadual - nos Campeonatos Gaúcho, Paulista e Mineiro.
Em
consonância com a opinião de Corrêa da Veiga, esses episódios não foram levados
adiante pelos tribunais regionais, não chegando ao STJD.
Os outros dois foram em
competições nacionais. Pela Série B do Campeonato Brasileiro, durante a partida
entre Bragantino e Macaé, no dia 16 de setembro, o zagueiro Brinner, do time
carioca, teria acusado torcedores do Bragantino de proferir xingamentos
racistas.
O atleta fez Boletim de Ocorrência e o árbitro registrou o incidente
na súmula.
Em contato com o STJD, foi explicado à Gazeta Esportiva que a
procuradoria arquivou o caso por não ser possível a identificação dos fatos
descritos na súmula.
Na outra ocorrência, que
aconteceu na Série D, no jogo entre Lajeadense e Central, do dia 27 de
setembro, as versões do estudo e do STJD divergem.
O relatório afirma que o
atleta Diego Lima disse ter sido vítima de injúria racial dos torcedores do
time local e o árbitro teria relatado o episódio em súmula.
Apesar disso, não
consta na súmula da partida qualquer narração sobre racismo. O STJD, inclusive,
enviou a súmula à reportagem para comprovação.
Para a produção do
relatório, foram utilizados dados da mídia nacional.
"Estes números podem,
portanto, ser apenas um indicativo de um problema, ainda mais amplo, afinal,
suspeitamos que há um grande número de casos os quais não são denunciados pelas
vítimas e/ou pela imprensa", concluiu o documento.
post: Marcelo Ferla
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