Vídeo
de brasileiros na Rússia é retrato de sexismo 'cotidiano' e é preciso um basta,
diz representante da ONU
Para o representante das Nações
Unidas, a exposição da mulher retratada no vídeo representa violência a todas
as mulheres e a indignação que o caso despertou precisa se refletir na prática.
Por BBC
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Representante da ONU
no Brasil lembra que maioria dos casos de violência psicológica contra mulheres
não tem visibilidade (Foto: ONU)
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No primeiro comentário
oficial das Nações Unidas sobre o vídeo em que brasileiros induzem uma mulher
russa a repetir palavras obscenas durante a Copa do Mundo da Rússia, o
representante do secretário-geral da ONU no Brasil, Maurizio Giuliano, lembra
que a violência psicológica contra mulheres acontece todos os dias – e, na
maioria esmagadora das vezes, não tem visibilidade.
"O vídeo foi gravado em
um lugar e em um contexto particularmente visíveis.
É a Copa do Mundo.
A
agressão foi filmada, envolve uma mulher estrangeira, reúne vários homens, não
apenas um, e também circulou online", diz Giuliano em entrevista à BBC
News Brasil.
"Mas é fundamental que
nos lembremos que este caso é um de uma série de agressões que acontecem todos
os dias, em todos os lugares.
E isso precisa de um basta", continua o
italiano, diretor do Centro de Informações da Organização das Nações Unidas
para o Brasil.
"Este caso particular é emblemático de um problema muito
amplo."
Segundo o representante da
ONU, a exposição da mulher retratada no vídeo representa uma violência para
todas as mulheres e a indignação que o caso despertou precisa se refletir na
prática, em situações cotidianas.
"Diferentemente do que
muitos pensam, a violência sexual não é apenas física, mas também pode ser
psicológica", afirma.
"Precisamos de uma consciência pública sobre
todas as formas de violência contra as mulheres."
Responsabilidade da Fifa
"O MPF entende que a
conduta dos brasileiros denegriu a dignidade e expôs a estrangeira a humilhação
pública, diante do cunho nitidamente machista e discriminatório percebido nas
imagens", diz a Procuradoria, em decisão divulgada na última quarta-feira.
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Neste vídeo, três
jovens são induzidas a dizer que querem fazer sexo com o torcedor brasileiro.
Elas repetem as palavras sem entender o significado delas (Foto: BBC)
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"A instauração da
investigação foi determinada com base nos artigos 1, 3 e outros da Convenção
Internacional sobre Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra a
Mulher.
O normativo estabelece a definição do que significa discriminação contra
a mulher e deixa acordado que os signatários devem garantir o exercício e gozo
dos direitos humanos e liberdades fundamentais em igualdade de condições com o
homem", continua a decisão.
Questionado sobre a postura
adequada para a Fifa em relação ao caso, o diretor das Nações Unidas no Brasil
aponta que qualquer grande organização ligada aos esportes tem obrigação de
evitar este tipo de episódio.
"Órgãos como a Fifa ou
Comitê Olímpico têm de tomar medidas para prevenir esse tipo de violência
sexual, seja física ou psicológica, através da educação e da
sensibilização", avalia.
O representante não quis
comentar o papel do Itamaraty ou do governos dos dois países.
"Em termos
de repercussão legal, cabe às autoridades russas e brasileiras determinarem o
melhor caminho", acrescentou.
Exposição dos envolvidos
O caso também levantou a
discussão sobre o que poderia ter se tornado "linchamento virtual"
dos envolvidos no vídeo, que em entrevistas ressaltaram indignação com a
exposição e preocupação com sua integridade física após o ocorrido.
Questionado, o diretor da
ONU afirma que eles devem receber tratamento digno e de acordo com a
legislação.
"Qualquer pessoa no
mundo que cometa qualquer tipo de ato questionável deve ser tratada de acordo
com a lei e as normas do sistema legal", diz Giuliano, que antes do Brasil
trabalhou em escritórios da ONU em locais como Afeganistão, Sudão e Timor
Leste.
Para o advogado russo Andrei
Shugaev, dificilmente esses casos poderiam ser enquadrados como crime ou
contravenção.
Segundo ele, falar palavrões em público é uma ofensa administrativa
punível com multa ou detenção.
No entanto, Shugaev destaca
que a polícia russa não tem agido com rigidez nesses casos durante a Copa do
Mundo.
A jurista e ativista
feminista russa Alena Popova, por sua vez, deu início a uma petição online, endereçada
ao Ministério de Assuntos Interiores da Rússia, pedindo que os autores do vídeo
sejam responsabilizados.
Segundo a petição, há
diferentes artigos na legislação do país que punem quem "publicamente
humilha a honra e a dignidade de uma menina ou mulher russa".
Conforme o
documento, os autores do vídeo podem ser enquadrados em dois artigos que
penalizam quem "insulta a outrem" ou "atenta contra a ordem
pública".
"Mais do que isso,
queremos que os estrangeiros que fizeram o vídeo peçam desculpas públicas à
jovem e a todos os cidadãos da Rússia pelo sexismo, desrespeito às leis russas,
desrespeito às cidadãs russas, insulto e humilhação baseada em gênero",
conclui a petição, que até o fechamento desta reportagem reunia 25 mil
assinaturas.
post: Marcelo Ferla
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