David Coimbra: Dilma está
sozinha.
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escreve de segunda a sábado em ZH
Talvez nos falte, a nós,
brasileiros, um tanto de profundidade na avaliação da personalidade de Dilma
Rousseff. É falha grave, porque se trata de algo importante, num país
presidencialista, a personalidade do presidente.
Entrevistei-a algumas vezes,
antes de ela se eleger presidente e depois também.
De uma coisa tenho certeza a
seu respeito: ela não é burra, como muitos querem fazer acreditar.
É claro que a oratória não
é a melhor qualidade de Dilma.
Ela se atrapalha quando verbaliza o que pensa —
o que não significa que pense errado.
O famoso discurso do estoque de vento,
por exemplo.
Seus defensores descobriram que existem tecnologias futuristas que
viabilizam o tal estoque de vento e argumentaram que isso prova o acerto de
Dilma.
Por favor! Esse é um argumento infantil, de discussão de boteco. Dilma
não fez um pronunciamento à frente do seu tempo, graças aos seus avançados
conhecimentos tecnológicos. E tampouco pretendia falar em "estoque de
vento", propriamente dito.
Queria falar em estoque "da energia
produzida pelo vento", e se expressou mal. Para usar um termo amado pela minha
amiga Cláudia Laitano: simples assim.
Outro discurso de Dilma
que roçou o ridículo, o da saudação da mandioca, também tem fundamento, se o
ouvinte usar da boa vontade. Os índios brasileiros que vivem como índios, em
ocas no meio do mato, sobrevivem por causa do cultivo da mandioca. Era isso que
ela queria dizer. Agora, é evidente que algum assessor um pouco mais esperto
poderia ter-lhe advertido que "saudar a mandioca", no Brasil, pegaria
mal.
E o que me intriga. Não há
ninguém com ascensão suficiente sobre Dilma para lhe dizer que ela só deve se
manifestar de público em discursos escritos previamente? Seus assessores são
tão ruins? Ou as pessoas sentem medo dela?
As respostas a essas
perguntas diriam muito sobre o futuro do Brasil. Porque agora Dilma parece
estar sozinha, ela e suas deliberações. É a mais densa solidão do poder que
enfrentou um presidente brasileiro desde Getúlio em 1954. Os aliados se voltam
contra ela. Os maiores críticos da condução econômica do governo são,
incrivelmente, os petistas. Os líderes do PT pedem a saída de Joaquim Levy da
Fazenda, alegando que a contingência de gastos proposta por ele não se coaduna
com as crenças do partido.
Isso é uma falsidade e uma
traição. Lula foi eleito em 2002. Até ele de fato começar a governar, essa
entidade sensível que é "O Mercado" ficou nervosíssima, o dólar
inflou-se aos R$ 4 de hoje, o desemprego pulsou, a inflação lambeu os dois
dígitos, era uma condição muito parecida com a de agora. A reação de Lula não
foi a de fazer um ajuste como Dilma propõe: o ajuste dele foi muito mais
rigoroso. Foi ortodoxo, conservador, neoliberal de raiz. E, entre os
condutores, lá estava ele: Joaquim Levy. Sim: Joaquim Levy foi secretário do
Tesouro Nacional de 2003 a 2006.
Por que, então, os
petistas atacam Dilma?
Por causa da conveniência
política.
Os petistas querem ficar
associados aos anos de fartura, não aos de escassez. Dilma, assim, se torna
alvo da oposição, que ambiciona tomar o seu lugar, e do seu próprio partido,
que almeja se distanciar da imagem da presidente, sem se distanciar dos cargos
no governo.
Dilma está isolada. E tem
resistido com bravura. Apesar de seus discursos confusos, apesar do seu
primeiro mandato irresponsável, apesar da irritante tolice de querer ser
chamada de presidenta, ela está sendo sensata em meio a tanto desvario. Sensata
e sozinha. E, espero, firme.
post: Marcelo Ferla
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