Autor de mais de 20 obras de ficção e não ficção, organizador de outras duas dezenas de antologias e tradutor de diversos livros, foi, ainda, articulista do The New York Times e do Washington Post.
É sobre sua experiência de vida em meio aos livros que o autor irá falar no encerramento da temporada 2014 do Fronteiras do Pensamento Porto Alegre, dia 3 de novembro, no Salão de Atos da UFRGS, às 19h45.
Para Manguel, os livros são ferramentas de primeira necessidade que possibilitam o conhecimento das coisas:
“As palavras numa página dão coerência ao mundo. Toda biblioteca é uma autobiografia.
A minha é um conjunto de possibilidades de quem sou”, afirma.
Os ingressos para a conferência estão esgotados. Informações no site www.fronteiras.com
Aprendeu a ler aos três anos de idade e, em meio à ditadura na Argentina, completou seus estudos iniciais.
Nesta época, aprendeu sobre a função humanizadora da literatura com um professor, entendendo que a ficção é uma mentira que conta a verdade dos personagens, que, no fundo, guardam as nossas experiências.
Anos mais tarde, descobriu que este mesmo professor que tanto o inspirou foi um informante da ditadura, responsável pela prisão e a morte de vários de seus colegas.
“Minha primeira reação foi rechaçar a literatura associada àquele professor. Mas percebi que ela é uma forma de manter atenção entre duas margens”, analisa o escritor.
“A imaginação faz com que inventemos histórias para reter nossa experiência. Para conhecê-las, desenvolvemos a leitura.”
E completa: “Essa foi para mim a experiência primária. Aprendi nos livros o que era a amizade, a morte, o amor, antes de conhecê-los na vida de carne e osso”.
Em busca de sua vocação, mudou-se para a Europa e, nos anos 1970, trabalhou em diversas editoras na Espanha, França, Itália, Inglaterra e Taiti. Nos anos 1980, instalou-se em Toronto, adotando a nacionalidade canadense.
Mora atualmente isolado no vilarejo de Mondion, nos arredores de Poitiers, na França.
No local, comprou uma antiga casa paroquial em ruínas e a reformou, transformando em residência. No celeiro, ao lado da casa, instalou sua vasta biblioteca, que soma mais de 35 mil volumes.
Sobre sua vida nômade, Manguel comenta: “Lugares chegam a nós da mesma maneira que pessoas.
A gente se enamora de alguém ou alguém se converte no melhor amigo por absoluta casualidade.
Em Poitiers, descobri uma cidade que me fascinou.
Arraigada na Idade Média, com a igreja românica mais linda de todo o mundo”.
Autor de Uma história da leitura, A biblioteca à noite, Dicionário de lugares imaginários – em coautoria com Gianni Guadalupi –, Os livros e os dias e A cidade das palavras. Em todas as suas obras, prega a leitura como a mais civilizada das paixões, uma celebração da alegria e da liberdade.
Ensaia sobre os valores e sentidos representados no ato de colecionar livros. Critica suas impressões de leitura que se entrelaçam com lembranças pessoais e reflexões sobre o mundo contemporâneo.
E revisita lugares imaginários da ficção mundial, criados por Umberto Eco ou Erico Verissimo. Sobre a literatura brasileira, aliás, celebra Guimarães Rosa e Machado de Assis, que mereceria, na visão do crítico, ocupar “o Olimpo da literatura latino-americana”, relembrando do “grande Monteiro Lobato e sua Emília”, com a qual se identificava na infância.
“Desde os meus três ou quatro anos, minha família viajava muito. Não contava com um lugar fixo, sempre meu. Esse lugar, para mim, foi o livro.
Lembro-me de sentir um alívio ao chegar em casa e encontrar num livro o mesmo texto, com a mesma ilustração, na mesma página”, recorda.
Sua mais recente obra, The Tower and The Worm, ainda inédita no Brasil, se refere à tendência de encastelamento na “torre de marfim” a que a atividade intelectual tem sido historicamente relegada no Ocidente.
O então adolescente passou a frequentar a casa do velho escritor para ler-lhe contos, tarefa que repetiu duas ou três vezes por semana entre os anos de 1964 e 1968.
Uma das versões dessa história pode ser lida em No bosque do espelho.
A convivência íntima transformou a figura e os livros de Borges em uma forte referência na literatura de Manguel.
“Ele me parava para falar do uso de determinada palavra ou de certas citações, dizia que uma citação poderia ajudar o leitor a acreditar na realidade da ficção e fazer com que ele pensasse que era mais inteligente que o escritor. Eram questões técnicas que ele gostava de observar e depois aplicar em seus contos”, relembra.
Mas não é o suporte, em si, o alvo da crítica do autor, e sim a finalidade econômica que tomou conta do processo.
“O intelectual não tem prestígio numa sociedade em que o que vale é o financeiro. As pessoas falam todo o tempo que as crianças e os jovens não leem.
Não é um problema isolado, mas consequência. Instruem a não nos ocuparmos de coisas que tomam tempo, que são profundas, lentas ou difíceis. Hanna Arendt define cultura como aprendizagem da atenção.
Toda a cultura que alimentamos hoje é contra a atenção, com um elenco de gadgets que requerem um salto constante de uma coisa a outra.”
Por isso, o escritor e ávido leitor Alberto Manguel é claro em suas crenças:
“Cada leitor deve escolher o seu caminho.
Quer comece pelo princípio ou pelo fim, ou vá pelos sites de forma aleatória ou à procura dos lugares específicos. Tudo depende do modo como gosta de viajar: se sabe exatamente aonde quer ir e tem um guia a organizar a viagem, ou se gosta de se deixar levar pela aventura sem saber onde o vai levar a estrada que escolheu”.
Através de uma série anual de conferências, o Fronteiras abre espaço para o debate e a análise da contemporaneidade e das perspectivas para o futuro, apresentando pensadores, artistas, cientistas e líderes que são vanguardistas em suas áreas de pesquisa e pensamento.
Dessa forma, o seminário internacional busca avaliar tendências, aceitando a provocação destes que são, hoje, alguns dos mais renomados pensadores em atuação no mundo, constituindo uma linha interdisciplinar de pensamento.
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