Torcedores
brasileiros visitam crianças com câncer e transformam hospital na Rússia em
‘arquibancada da Copa’
Ricardo Senra
Enviado especial da
BBC News Brasil a Samara (Rússia)
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Vestidos de verde e
amarelo, os brasileiros distribuíram presentes e brincaram com as crianças que
estão passando por tratamento de quimioterapia
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Um grupo de torcedores
brasileiros surpreendeu crianças com câncer de um hospital público em Samara,
na Rússia, na véspera do jogo da seleção nas oitavas de final da Copa do Mundo.
Às 9h, enquanto as crianças
recebiam medicamentos e passavam por sessões de quimioterapia, o grupo apareceu
caracterizado como "doutores da alegria" vestidos de verde e amarelo.
Eles trouxeram um saco de presentes – de óculos de palhaço a balões e bandeiras
do Brasil.
Repetindo o gesto da torcida
nos estádios, de gritar os nomes dos jogadores escalados para os jogos da Copa,
os pequenos russos internados no "Hospital Infantil 1" também tiveram
seus nomes gritados pelos brasileiros.
"Dimitri! Dimitri!
Dimitri"
"Ivan! Ivan!
Ivan!"
"Olga! Olga!
Olga!"
Os que conseguiam se
levantar foram acompanhar a trupe nos corredores do hospital e chegaram a jogar
futebol com os brasileiros com balões infláveis.
Os demais receberam visitas
e ganharam presentes nos próprios quartos.
"O mais marcante foi um
menino com os movimentos bem limitados que tocou pandeiro para os brasileiros
sambarem.
Deu pra ver que ele achou o máximo os próprios movimentos terem
criado um ritmo para as pessoas dançarem", disse a brasileira Ohana Berger,
que estuda em Samara e atuou como tradutora voluntária entre os torcedores e os
pacientes, médicos e familiares.
"Me fez pensar em como,
às vezes, uma coisa besta para a gente é motivo de alegria para um menino como
aquele."
'Patch Adams'
Por duas horas, os pequenos
se fantasiaram com os mesmos apetrechos que os torcedores usam nas
arquibancadas.
A surpresa foi divulgada, em
russo, pela Prefeitura de Samara.
A imprensa local descreveu a visita como uma
"festa para as crianças".
O grupo, formado por
médicos, empresários, estudantes e jornalistas, inicialmente resistiu a
conversar com a BBC News Brasil.
"Isso não é marketing.
Fizemos de coração.
Não queremos que isso seja percebido como oportunismo
porque não é e nunca quisemos divulgar.
Você que nos achou.
Nós fizemos com
amor", diz o mastologista paulista Fernando Pontes, após concordar em
receber a reportagem.
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Ideia dos brasileiros
que visitaram o hospital é unir 'medicina com alegria', para ajudar na
recuperação das crianças
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Antes da surpresa em Samara,
o mesmo grupo tentou fazer visitas a hospitais em Moscou e São Petersburgo, mas
não obteve autorização das instituições.
O médico explica a motivação:
"Desde que resolvi fazer medicina, meu principal ícone e exemplo é o Patch
Adams.
Fui a palestras dele em pessoa, cheguei a conhecê-lo", conta
Pontes, que criou o grupo "Torcedores da Alegria" em 2008, junto a
amigos.
Hoje com 73 anos, Adams ficou
mundialmente famoso após ser interpretado pelo ator Robin Williams em filme
homônimo.
O americano defende que medicina e alegria devem caminhar de mãos
dadas.
"Queríamos levar a
energia e a positividade do estádio para quem não tem condições de estar no
campo porque está doente", resume o mastologista.
'Primeira coisa do tipo no
hospital'
Para outro dos
torcedores-palhaços, a iniciativa funcionou como "um banho de
cachoeira".
"De ambos os lados.
Nós
lavamos a alma.
Perguntamos a uma das crianças se ela gostava de futebol e ela
respondeu: 'sim, torço para o Brasil'", diz o publicitário José Ricardo
Mannis.
"No começo elas estavam
ressabiadas.
Não estavam acostumadas.
Depois se soltaram, jogaram bola com
bexiga, teve gente que se emocionou, chorou, a reação foi muito linda",
completa o empresário Bruno Zangari.
"Eu estudo isso e sei
que a risada e a energia positiva ajudam na recuperação.
Os estudos provam que
o alto astral traz imunidade e recuperação.
Quando saímos, as crianças estavam
com outro semblante", diz o médico Pontes.
A reação das crianças
contaminou pediatras e oncologistas do hospital, que aceita doações para manter
suas atividades.
"Todos os médicos
ficaram encantados e disseram que foi a primeira coisa do tipo que aconteceu
neste hospital", diz a tradutora voluntária Ohana Berger.
"E todas as
crianças disseram que, além da Rússia, torciam para o Brasil."
A tradutora voluntária não vai
esquecer o episódio tão cedo.
"Um momento que também
me marcou foi quando a enfermeira disse:
'Quem puder, pode dançar com eles!'.
Nem todas as crianças foram.
Algumas só mexeram os braços do lugar de onde
estavam sentadas, porque não conseguiam fazer movimentos muito abertos",
lembra a estudante.
Os organizadores da visita
também fazem parte do Movimento Verde Amarelo, que acompanha a seleção e
equipes do Brasil de outros esportes para reunir a torcida brasileira em
eventos nacionais e internacionais.
"A gente não vai
colocar isso nas nossas redes sociais, nunca quisemos nos promover com isso.
Por favor, é muito importante que isso fique claro, a ação não tem a ver com
promoção", diz Zangari.
O Brasil enfrenta o México
em Samara nesta segunda-feira, às 11h de Brasília, pelas oitavas de final da
Copa do Mundo.
post: Marcelo Ferla
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