GERAÇÃO QUE ENCONTROU O
SUCESSO NO PEDIDO DE DEMISSÃO.
Por Ruth Manus
O cenário é mais ou menos
esse: amigo formado em comércio exterior que resolveu largar tudo para
trabalhar num hostel em Morro de São Paulo, amigo com cargo fantástico em
empresa multinacional que resolveu pedir as contas porque descobriu que só quer
fazer hamburger, amiga advogada que jogou escritório, carrão e namoro longo pro
alto para voltar a ser estudante, solteira e andar de metrô fora do Brasil,
amiga executiva de um grande grupo de empresas que ficou radiante por ser
mandada embora dizendo “finalmente vou aprender a surfar”.
Você pode me dizer “ah,
mas quero ver quanto tempo eles vão aguentar sem ganhar bem, sem pedir dinheiro
para os pais.”. Nada disso. A onda é outra.
Venderam o carro, dividem
apartamento com mais 3 amigos, abriram mão dos luxos, não ligam de viver com
dinheiro contadinho.
O que eles não podiam mais aguentar era a infelicidade.
Engraçado pensar que o
modelo de sucesso da geração dos nossos avós era uma família bem estruturada.
Um bom casamento, filhos bem criados, comida na mesa, lençóis limpinhos. Ainda
não havia tanta guerra de ego no trabalho, tantas metas inatingíveis de
dinheiro.
Pessoa bem sucedida era aquela que tinha uma família que deu certo.
E assim nossos avós
criaram os nossos pais: esperando que eles cumprissem essa grande meta de
sucesso, que era formar uma família sólida.
E claro, deu tudo errado.
Nossos
pais são a geração do divórcio, das famílias reconstruídas (que são lindas,
como a minha, mas que não são nada do que nossos avós esperavam).
O modelo de
sucesso dos nossos avós não coube na vida dos nossos pais. E todo mundo ficou
frustrado.
Então nossos pais
encontraram outro modelo de sucesso: a carreira.
Trabalharam duro,
estudaram, abriram negócios, prestaram concurso, suaram a camisa.
Nos deram o
melhor que puderam.
Consideram-se mais ou menos bem sucedidos por isso: há uma
carreira sólida?
Há imóveis quitados? Há aplicações no banco?
Há reconhecimento
no meio de trabalho?
Pessoa bem sucedida é aquela que deu certo na carreira.
E assim nossos pais nos
criaram: nos dando todos os instrumentos para a nossa formação, para garantir
que alcancemos o sucesso profissional.
Nos ensinaram a estudar, investir,
planejar.
Deram todas as ferramentas de estudo e nós obedecemos.
Estudamos,
passamos nos processos seletivos, ocupamos cargos.
E agora?
O que está
acontecendo?
Uma crise nervosa.
Executivos que acham que seriam mais felizes se fossem tenistas. Tenistas que
acham que seriam mais felizes se fossem bartenders.
Bartenders que acham que
seriam mais felizes se fossem professores de futevolei.
Percebemos que o sucesso
profissional não nos garante a sensação de missão cumprida. Nem sabemos se
queremos sentir que a missão está cumprida.
Nem sabemos qual é a missão.
Nem
sabemos se temos uma missão.
Quem somos nós?
Nós valorizamos o amor e a
família. Mas já estamos tranquilos quanto a isso.
Se casar tudo bem, se separar
tudo bem, se decidir não ter filhos tudo bem.
O que importa é ser feliz. Nossos
pais já quebraram essa para a gente, já romperam com essa imposição.
Será que
agora nós temos que romper com a imposição da carreira?
Não está na hora de
aceitarmos que, se alguém quiser ser CEO de multinacional tudo bem, se quiser
trabalhar num café tudo bem, se quiser ser professor de matemática tudo bem, se
quiser ser um eterno estudante tudo bem, se quiser fazer brigadeiro para festas
tudo bem?
Afinal, qual o modelo de
sucesso da nossa geração?
Será que vamos continuar
nos iludindo achando que nossa geração também consegue medir sucesso por conta
bancária?
Ou o sucesso, para nós, está naquela pessoa de rosto corado e de
escolhas felizes? Será que sucesso é ter dinheiro sobrando e tempo faltando ou
dinheiro curto e cerveja gelada?
Apartamento fantástico e colesterol alto ou
casinha alugada e horta na janela?
Sucesso é filho voltando de transporte
escolar da melhor escola da cidade ou é filho que você busca na escolinha do
bairro e pára para tomar picolé de uva com ele na padaria?
Parece-me que precisamos
aceitar que nosso modelo de sucesso é outro.
Talvez uma geração carpe diem. Uma
geração de hippies urbanos.
Caso contrário não teríamos tanta inveja oculta dos
amigos loucos que “jogaram diploma e carreira no lixo”.
Talvez- mera hipótese-
os loucos sejamos nós, que jogamos tanto tempo, tanta saúde e tanta vida, todo
santo dia, no lata de lixo.
post: Marcelo Ferla
colaboração: Nani Nascimento
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