O Genocídio em Ruanda
(português brasileiro) ou no Ruanda (português europeu) foi o massacre
perpetrado por extremistas hutus contra tutsis e hutus moderados, em Ruanda,
entre 6 de abril e 4 de julho de 1994 .
Antecedentes
Distinguem-se no Ruanda
dois grupos étnicos: a maioria hutu e o grupo minoritário, tutsi. Desde a
independência do país da Bélgica, os seus líderes foram sempre tutsis, num
contexto de rivalidade étnica que se acentuou com o tempo, dada a escassez de
terras e a fraca economia nacional, sustentada pela exportação de café.
Em
1989, o preço mundial do café reduziu-se em 50%, e Ruanda perdeu 40% de sua
renda oriunda de exportações. Nessa época, o país enfrentou sua maior crise
alimentar em 50 anos, ao mesmo tempo que aumentavam os gastos militares em
detrimento de investimentos em infraestrutura e serviços públicos.
Em outubro de 1990, a
Frente Patriótica Ruandesa, composta por exilados tutsis expulsos do país pelos
hutus com o apoio do exército, invade Ruanda pela fronteira com Uganda. Em
1993, os dois países firmam um acordo de paz - o Acordo de Arusha.
Cria-se em Ruanda um
governo de transição, composto por hutus e tutsis.
Em 1994, as tropas hutus,
chamadas Interahamwe, são treinadas e equipadas pelo exército ruandês, em meio
a arengas e incitação à confrontação com os tutsis por parte da Radio
Télévision Libre de Mille Collines (RTLM), dirigida pelas facções hutus mais
extremas. Essas mensagens exaltavam as diferenças que separavam ambos os grupos
étnicos e, à medida que os ânimos se exaltavam, os apelos à confrontação e à
"caça aos tutsis" tornaram-se mais explícitos, sobretudo a partir do
mês de abril, em que se fez circular o boato de que a minoria tutsi planejava o
genocídio dos hutus.
De acordo com a jornalista
britânica Linda Melvern,1 que teve acesso a documentos oficiais, o genocídio
foi planejado. No início da carnificina, a tropa ruandesa era composta por
30.000 homens (um membro por cada dez famílias) e organizados por todo o país
com representantes em cada vizinhança. Alguns membros da tropa podiam adquirir
fuzis de assalto AK-47 tão somente preenchendo um formulário de demanda. Outras
armas, tais como granadas, nem sequer requeriam esse trâmite e foram
generosamente distribuídas.
Apurou-se que o genocídio
foi financiado, pelo menos parcialmente, com o dinheiro apropriado de programas
internacionais de ajuda, tais como os financiados pelo Banco Mundial e pelo
Fundo Monetário Internacional como Programa de Ajuste Estrutural. Estima-se que
134 milhões de dólares foram gastos na preparação do genocídio em Ruanda — uma
das nações mais pobres da terra — sendo que 4,6 milhões de dólares foram gastos
somente em facões, enxadas, machados, lâminas e martelos.
Tal
despesa permitiu a distribuição de um novo facão a cada três varões hutus.
Segundo Melvern, o
primeiro-ministro de Ruanda, Jean Kambanda, revelou2 que o genocídio foi
discutido abertamente em reuniões de gabinete, e uma ministra teria dito que
ela era "pessoalmente a favor de conseguir livrar-se de todo os tutsis...
sem os Tutsis todos os problemas de Ruanda desapareceriam".
Na década de 1960,
seguindo o processo de descolonização do pós-Segunda Guerra, o território
ruandês foi deixado pelos belgas. Em quase meio século de dominação, ódio entre
as duas etnias transformara aquela região em uma bomba prestes a explodir.
Cercados por uma série de problemas, a maioria hutu passou a atribuir todas as
mazelas da nação à população tutsi.
Pressionados pelo
revanchismo, os tutsis abandonaram o país e formaram imensos campos de
refugiados em Uganda. Mesmo acuados, os tutsis e alguns hutus moderados se
organizaram politicamente com o intuito de derrubar o governo do presidente
Juvenal Habyarimana e retornar ao país. Com o passar do tempo, esta mobilização
deu origem à Frente Patriótica Ruandense (FPR), liderada por Paul Kagame.
Na década de 1990, vários
incidentes demarcavam a clara insustentabilidade da relação entre tutsis e
hutus. No ano de 1993, um acordo de paz entre o governo e os membros do FPR não
teve forças para resolver o conflito.
O ponto alto dessa tensão ocorreu no dia
6 de abril de 1994, quando um atentado derrubou o avião que transportava o
presidente Habyarimana. Imediatamente, a ação foi atribuída aos tutsis ligados
ao FPR.
Na cidade de Kigali,
capital da Ruanda, membros da guarda presidencial organizaram as primeiras
perseguições contra os tutsis e hutus moderados que formavam o grupo de
oposição política no país.
O
genocídio
Evolução demográfica de
Ruanda. Repara-se a notável descida na primeira metade dos anos 90 provocada
pelo genocídio.
Em abril de 1994, após o
assassinato do presidente Juvénal Habyarimana, em atentado ao avião em que
viajava, o avanço da Frente Patriótica Ruandesa produziu uma série de massacres
no país contra os tutsis, o que causou um deslocamento maciço da população para
os campos de refugiados situados nas áreas de fronteira, em especial com o
Zaire (hoje República Democrática do Congo).
Em agosto de 1995, tropas do Zaire
tentaram forçar o retorno desses refugiados para Ruanda.
Catorze mil pessoas
foram então devolvidas a Ruanda, enquanto outras 150.000 refugiaram-se nas
montanhas.
Mais de 500.000 pessoas
foram massacradas. Quase todas as mulheres foram estupradas. Muitos dos 5.000
meninos nascidos dessas violações foram assassinados.
As atrocidades envolveram
também os religiosos. Muitos clérigos de várias denominações se posicionaram a
favor de sua etnia. Padres, freiras, pastores e bispos tomaram o seu partido em
ambos os lados. Pelo menos 300 clérigos e freiras foram mortos por serem tutsis
ou porque estavam ajudando os tutsis.
Outros, da etnia hutu, apoiaram ou até
mesmo colaboraram com os matadores.
Um dos casos que se tornaram muito
conhecidos foi o que envolveu o Dr. Gerard Ntakirutimana, 45, médico
missionário que trabalhava em um hospital da Igreja Adventista do Sétimo Dia de
Mungonero, e seu pai, Elizaphan Ntakirutimana, um pastor protestante. Os
membros do Tribunal Penal Internacional para Ruanda condenaram por unanimidade
o Dr. Ntakirutimana, por genocídio e por crimes contra a humanidade. Ele foi
sentenciado a 25 anos de prisão, pela morte de duas pessoas e por atirar em
refugiados tutsis em vários locais. Foi condenado também por participar de
vários ataques contra tutsis na Colina de Murambi e na Colina de Muyira.
Seu
pai, o Pastor Elizaphan Ntakirutimana, 78, presidente da associação da Igreja
Adventista do Sétimo Dia em Mugonero, no oeste de Rwanda, foi condenado a 10
anos de prisão por crimes menores.
O Pr. Elizaphan levou os atacantes para
Igreja Adventista de Murambi, em Bisesero, onde era pastor presidente, e
ordenou a remoção do telhado do edifício, a fim de localizar os tutsis que lá
estavam abrigados. O ato conduziu à morte de muitos dos que estavam no local.
Ele também levou os atacantes a vários locais, para caçar tutsis.
De acordo com a BBC,
centenas de tutsis, dentre membros e pastores, que procuraram refúgio na igreja
e no hospital adventista, enviaram uma carta ao Pr. Elizaphan Ntakirutimana
pedindo socorro. A carta, segundo a BBC incluia a frase: "Nós desejamos informá-lo de que amanhã seremos mortos juntamente com nossas famílias".
A resposta do Pr.
Elizaphan Ntakirutimana foi de que eles deviam se preparar para morrer. As
milícias hutu, segundo testemunhas, chegaram pouco tempo depois com os
Ntakirutimanas. Só alguns tutsis sobreviveram a agressão.
Os Ntakirutimanas
disseram no tribunal que eles tinham deixado a área antes das matanças.
O Pr.
Elizaphan Ntakirutimana fugiu para os Estados Unidos depois do massacre, mas
foi extraditado para a Tanzânia.
Outro adventista, gerente
do Hotel Mille Collines, em Kigali, foi o responsável pela salvação de 1.268
tutsis e hutus, abrigando-os no hotel. Paul Rusesabagina ficou mundialmente
conhecido ao ser retratado no filme Hotel Ruanda.
Rusesabagina, hoje residente
na Bélgica, afirma que, se não forem tomadas posturas duras contra o tribalismo
em Ruanda, o genocídio poderá voltar a ocorrer, agora pelas mãos dos tutsis,
"governantes" do país desde o fim da matança. Rusesabagina ficou
conhecido como o Oskar Schindler de Ruanda.
O
Tribunal Penal Internacional para Ruanda
Em 8 de novembro de 1994,
através da resolução 955 do Conselho de Segurança da ONU, foi criado o Tribunal
Penal Internacional para Ruanda (TPIR) para julgar os principais responsáveis
pelo genocídio.
A Corte Penal
Internacional é competente para julgar somente os crimes cometidos após a sua
criação, em 1º de julho de 2002. Não é portanto competente para julgar os
crimes cometidos em Ruanda, durante o genocídio.
O primeiro-ministro do
governo interino ruandês, Jean Kambanda, foi julgado culpado e condenado por
genocídio pelo TPIR, 75% dos membros do governo interino foram presos. Vários
ministros desse governo foram considerados culpados de participação no
genocídio ou estão em fase de julgamento. Dois outros foram liberados. Em
2011, alguns antigos chefes militares foram considerados culpados de
genocídio.4 .
Calcula-se que 800 mil
tenham sido mortas no genocídio de Ruanda.
Assista agora ao documentário "Ruanda, histórias de um
genocídio.".
"O pior mesmo era não
saber o que viria amanhã. A dor no espírito é que me fazia mal. A imaginação
fértil de como teriam matado meus pais e irmãos e poderiam me matar a qualquer
momento. O sentimento de que a morte podia chegar a qualquer momento, de não
estar em paz em um só minuto."
Immaculée Ilibagiza: seu
sobrenome significa “bela e brilhante de corpo e alma”.
Ver também:
Hotel
Ruanda
Tiros
em Ruanda
Immaculée
Ilibagiza
Corneille
Shake
Hands With the Devil: The Journey of Romeo Dallaire
UN
Assistance Mission for Rwanda (UNAMIR)
Informações
do ICTR sobre Elizaphan Ntakirutimana e seu filho (em inglês)
Paul
Rusesabagina
Marcelo Ferla
fonte: Wikipédia, Veja e Youtube
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