Passa, passa Pasadena.
Fernando Gabeira
Água era o meu foco.
Revisitava o Rio Piracicaba castigado pela seca. No passado fui a algumas
reuniões do Comitê de Bacia. Já havia na época uma preocupação com o futuro do
rio, tão solicitado: abastece uma região em crescimento e mais 8,8 milhões de
pessoas em São Paulo.
Lembrei, à beira do
Piracicaba, alguns autores no fim do século passado afirmando que a água seria
o petróleo do século 21, com potencial de provocar conflitos e até guerras. Mas
ao falar no petróleo como algo do passado constatei que está na ordem do dia.
Enterraram uma fortuna em Pasadena, no Texas. Outra Pasadena, na Califórnia, é
a cidade cenário da sitecom The Big Bang Theory.
Pois é, nossa Pasadena
começou com um singular ponto que se expande de forma vertiginosa. Foi uma
espécie de Big Bang na consciência dos que ainda duvidavam que a Petrobrás
estivesse indo para o buraco nas mãos dos aliados PT e PMDB. Diante dos fatos,
vão-se enrolar de novo na Bandeira Nacional, sobretudo num momento de Copa do Mundo,
fulgurante de verde e amarelo.
Os críticos da Petrobrás
não são bons brasileiros. Bons são os que se apossaram dela e a fizeram perder
R$ 200 bilhões nestes anos e despencar no ranking das grandes empresas do
mundo.
O líder do governo,
senador Eduardo Braga (PMDB-AM), disse que a perda desse dinheiro faz parte do
jogo capitalista de perde e ganha. Se fosse numa empresa privada, dificilmente
seus diretores resistiriam no cargo.
Em Pasadena enterrou-se dinheiro público.
O que deveria ser mais grave em termos políticos.
Pasadena é uma boa versão
com sotaque latino para Waterloo. Dilma Rousseff afirma que assinou a compra da
refinaria no Texas sem conhecer as cláusulas. Depois disso conheceu. Ela lançou
uma nota para explicar o momento em que não sabia. E se esqueceu de explicar
todos os anos de silêncio e inação.
Os diretores que teriam
omitido as cláusulas que enterram mais de US$ 1 bilhão em Pasadena continuaram
no cargo. Até a coisa explodir mesmo. Tenho a impressão de que tentaram
sentar-se em cima da refinaria de Pasadena. Sentaram-se numa baioneta, porque
não se esconde um negócio desastroso de mais de US$ 1 bilhão.
Os fatos começam a se
desdobrar agora que os olhares se voltam para esse refúgio dos nacionalistas,
defensores da Pátria enriquecidos.
Uma empresa holandesa
cobrou US$ 17 milhões da Petrobrás por serviços que não constavam do contrato.
A primeira parcela da compra em Pasadena foi declarada como US$ 360 milhões,
mas no documento americano ela foi registrada como uma compra de US$ 420 milhões.
Refinarias compradas no Japão têm as mesmas cláusulas do contrato desastroso de
Pasadena.
Um amigo de Brasília me
disse ao telefone: “Se esse Paulo Roberto Costa, diretor da Petrobrás, abrir a
boca, a República vai estremecer”. Conversa de Brasília. Quantas vezes não se
falou o mesmo de Marco Valério?! O que pode trazer revelações são os computadores,
pen drives e documentos encontrados na casa dele. A Polícia Federal não
acreditava que ele iria falar, tanto que o prendeu com o argumento de que
estava destruindo provas.
Passa, passa, Pasadena,
quero ver passar. A Petrobrás da nossa juventude, dos gritos de “o petróleo é
nosso”, se tornou o reduto preferido dos dois grandes partidos que nos
governam. O petróleo é deles, do PT e do PMDB.
Levaram o slogan ao pé da letra
e suas pegadas na maior empresa do País demonstram que devoram até aquilo que dizem
amar.
De certa forma, isso já
era evidente para mim nas discussões dos contratos do pré-sal. Eles impuseram
uma cláusula que obriga a Petrobrás a participar de todos os projetos de
exploração. Não deram a chance à empresa de recusar o que não lhe interessava.
Tudo isso é para
fortalecer a Petrobrás, isto é, fortalecer-se com ela, com uma base de grandes
negócios, influência eleitoral e, de vez em quando, uma presepada nacionalista,
tapas imundos de óleo nas costas uns dos outros, garrafas de champanhe
quebradas em cascos de navios.
Lá, no Texas, os magnatas
do petróleo usavam aqueles chapéus de cowboy. Lá, em Pasadena. Aqui, os nossos
magnatas em verde e amarelo estão com poucas opções no momento. Ou reconhecem o
tremendo fracasso que é a passagem dos “muy amigos” da Petrobrás pela direção
da empresa ou se enrolam na Bandeira e acusam todos de estarem querendo vender
a Petrobrás. Diante das eleições e da Copa do Mundo, devem optar por uma
alternativa mais carnavalesca.
Mas os fatos ainda não são
de todo conhecidos. Deverá haver uma intensa guerra de bastidores para que não
o sejam, especialmente os documentos nas mãos da Polícia Federal.
Pasadena. Certos nomes me
intrigam. O mensalão não seria o
que foi se não houvesse esse nome tão popular inventado por Roberto Jefferson,
que no passado apresentava programas populares de TV. Pasadena soa como algo
esperto, dessas saidinhas em que você vai e volta em cinco minutos, leve e
faceiro. Mas pode ser que Pasadena não passe e fique ressoando por muito tempo,
como o mensalão. E se tornar uma saidinha para comprar cigarros, dessas sem
volta, para nunca mais.
Criada uma comissão no
Congresso Nacional, envolvidos Ministério Público e Polícia Federal, podem sair
informações que, somadas às de fontes independentes, deem ao País a clara visão
do que é a Petrobrás no período petista. Não tenho esperança de que depois
disso todos se convençam de que a Petrobrás foi devastada. Mas será divertido
vê-los brigando com os fatos, com as mãos empapadas de óleo.
Diante do Rio Piracicaba
meu foco é a água. Na semana passada, vi como na Venezuela o uso político do
petróleo deformou o país. No Brasil o alvo da voracidade aliada é a Petrobrás.
E se a água é o petróleo
do século 21, daqui a pouco vão descobri-la, quando vierem lavar as mãos nas
margens dos nossos rios.
Artigo publicado no jornal
O Estado de São Paulo em 28/03/2014
texto: Fernando Gabeira
post: Marcelo Ferla
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