Mulheres admiráveis.
MARTHA MEDEIROS - De onde
surgem os amores
Uma amiga na casa dos 50
estava solteira há anos. Não tinha namorado e tampouco se sentia ansiosa com
isso. Já havia casado duas vezes, tinha um filho bacana e podia muito bem viver
sem amor, essas mentiras que a gente conta para nós mesmos.
De qualquer forma, para
não perder o hábito, de vez em quando se produzia e ia pra balada, vá que. Mas
voltava invariavelmente sozinha para casa. Até que um ex-paquera do tempo que
ela era uma debutante fez contato ele, que morava no Exterior, voltaria para o
Brasil e queria revê-la. Milagre by Facebook.
Ela disse claro, vai ser
ótimo, mas não sabia quando exatamente a promessa desembarcaria no Salgado
Filho. Seguiu sua vida. Foi para a piscina do clube num dia de semana e lá,
estando acima do peso, suada e com um biquíni velho, escutou seu nome sendo pronunciado
por uma voz aveludada. Era o dito cujo, testemunhando in loco no que a
debutante havia se transformado depois de tantos anos. Ela pensou: o cara vai
sair correndo.
Ele pensou: não desgrudo
mais dessa mulher. E assim foi. Certa de que só estando impecável atrairia
olhares, ela conquistou um guapo num dia em que se sentia pouco atraente.
Outra história. Atriz,
loira, olhos verdes, leva um fora do noivo. Passa dias inchada de tanto chorar.
Deprê em estágio avançado. A avó organiza um almoço do tipo italiano, aberto ao
público. Ela vai e encontra um velho conhecido com quem brincava na infância.
Ele, recém-separado. Ela, um trapo.
Ficam ali conversando, ela
aos lamentos por sua situação, quando, em meio a soluços, a mulher se engasga.
Mas engasga feio. De quase morrer. Uns 10 vieram esmurrar suas costas, e a
guria vertendo lágrimas sem conseguir respirar, roxa como uma berinjela, já
encomendando a alma. Ela me conta: naquele dia, eu havia saído de casa medonha,
e o engasgo só piorou o quadro, eu parecia o demo convulsionando. Mas o
amiguinho de infância não teve essa impressão. No dia seguinte, ligou para
saber se ela passava bem, e estão casados há 15 anos.
Mais uma: depois de duas
décadas de uma relação bem vivida, veio a separação amigável. Porém, mesmo
amigável, nunca é fácil sair de um casamento, ainda mais de um casamento que
não era um inferno, apenas havia acabado por excesso de amizade.
Ela pensou: agora é a hora
do luto, um recolhimento me fará bem. Não deu uma semana e um estranho tocou o
número do seu apartamento no porteiro eletrônico. Ela não reconheceu a voz, o
nome, não sabia quem era, e não deu trela. Ele tentou no dia seguinte: ela
tampouco abriu a porta, achou que o cara havia se enganado de prédio. No
terceiro dia, ela resolveu esclarecer pessoalmente o equívoco. Desceu até a
portaria para convencer o insistente de que ela não era quem ele procurava.
Era.
Do que se conclui: de onde
muito se espera – boates, festas, bares – é que não surge nada. O amor prefere
se aproximar dos distraídos.
Texto: Martha Medeiros
Post: Marcelo Ferla
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