O
Mecanismo: mapeamos todas as referências que você não percebeu
Galvão Engenharia virou
"Bueno Engenharia".
O nome de Lula faz referência à Roma Antiga.
Veja
quem é quem, e entenda todas as alusões da série.
Por Ana Carolina
Leonardi, Alexandre Versignassi, Sophia Fernandez
A série de José Padilha
sobre a Operação Lava-Jato se envolveu em um mar de polêmicas desde que foi
lançada.
Mesmo deixando a guerra ideológica de lado, ainda assim é difícil
acompanhar o ritmo de referências que são jogadas o tempo inteiro na cara do
telespectador (algumas com claros traços de tiração de sarro, outras mais
críticas).
Se você se perdeu tentando manter o fio da meada entre trocadilhos e
mudanças de nome, não se preocupe: mapeamos cada um dos principais vinte e três
personagens (e os detalhes por trás deles) que passaram pela tela durante os 8
episódios de O Mecanismo.
Polícia Federal e a Justiça
A série optou por começar em
2003, com o escândalo do Banestado, no Paraná.
E no início, é tudo preto no
branco: os policiais federais são os heróis absolutos.
Os bandidos, uma gangue
caricata que acaba escapando pelos dedos dos mocinhos graças à burocracia e a
má vontade do Ministério Público (que passa a série toda sofrendo uma crítica
velada).
Gerson / Ruffo O delegado Gerson Machado é uma das figuras menos
famosas da vida real a inspirar a série.
Investigou Alberto Youssef (mais sobre
ele abaixo) no Banestado, mas se aposentou antes da Lava Jato começar – e ficou
deprimido.
Já a maluquice de Marco Ruffo (e sua voz sussurada) são
contribuições exclusivas de Selton Mello à ficção.
Verena / Erika A delegada
Erika Mareno, a inspiração por trás da protagonista Verena, recebeu o crédito
por nomear a Operação Lava-Jato, da qual participou de 2013 a 2016.
Depois de
sair da força-tarefa, ela se envolveu em uma polêmica ao investigar o reitor da
Universidade Federal de Santa Catarina, que cometeu suicídio.
Essa semana, foi
empossada como superintendente da PF em Sergipe.
Juiz Paulo Rigo / Sérgio Moro
Moro é um dos heróis da série, naturalmente.
Seu personagem é metódico, sereno
e apaixonado pela Justiça.
Mas não se trata de um arquétipo da perfeição: os
últimos episódios revelam um Moro embriagado pela fama, que adota uma nova
assinatura para dar autógrafos mais marcantes e regozija-se com os panelaços –
que não são tratados pelo roteiro como manifestação de indignação justa, mas de
ingenuidade dos eleitores que tinham votado em Aécio – quer dizer, em Lúcio.
Em uma das referências mais
discretas da série, Rigo é visto lendo na cama uma espécie de graphic novel de
uma versão alternativa do Batman – uma alusão ao papel de “vigilante da
justiça” que já foi atribuído a Moro.
A equipe Guilhome não tem
lastro exato em uma pessoa real.
A relação com Anselmo vem da prisão de Alberto
Youssef – o delegado foi responsável pela ligação telefônica que localizou o
doleiro, essa sim real.
Youssef foi preso em 2014 – no Maranhão, não em São
Paulo.
E a mala de dinheiro que ele levava, no hotel com vista pro mar,
continha R$ 1,4 milhão.
E estava endereçada não a uma campanha presidencial,
mas a um secretário do governo maranhense, na gestão de Roseana Sarney.
Por
fim, o famoso Japonês da Federal.
Na série, (no ápice do politicamente
incorreto) ele é o China.
A insinuação nada velada de sua incompetência aparece
logo no segundo episódio.
O China “morre” pelo estômago, no maior clichê
americano do policial preguiçoso – falta só o donut.
O cafézinho ele já tem.
Doleiros e capangas: os
primeiros acusados
O primeiro elenco de vilões
apresentado pela série são os acusados originais da Lava-Jato – aqueles que, de
fato, disfarçavam suas operações de lavagem de dinheiro num posto de gasolina
em Brasília.
Nelma Kodama tentou sair do país com 200 mil euros escondidos na
calcinha – um truque que é usado com prostitutas na série para distribuir
dinheiro pela capital.
Carlos Habib Chater, que na série virou Chebab (são
várias as piadas com comida árabe) foi o primeiro das dezenas de presos da
Operação.
E, como a realidade tende a ser ainda mais surreal que a ficção,
assim que Chater saiu da prisão, voltou a gerenciar o posto de gasolina onde
tudo começou.
Família pouco unida – e
muito ouriçada
– De forma idêntica à vida
real, a trama da série ganha uma nova dimensão política quando o diretor da Petrobras(il)
vê seus esquemas desmascarados por uma Evoque.
Paulo Roberto Costa foi pego
pela nota fiscal do carro que ganhou de Alberto Youssef por R$ 250 mil
(desarrendondado para R$ 251 mil na série).
A família inteira dele segue
implicada na Lava Jato.
Mas na série suas duas filhas foram fundidas em uma só,
assim como seus genros.
Shanni e Arianna Bachmann foram fundidas para virar
Shayenne (uma das paródias de nome mais toscas de O Mecanismo).
O marido dela,
Ricky, é uma mistura de Márcio Lewkowicz, casado com Arianna, e Humberto
Sampaio de Mesquita, falecido marido de Shanni.
Os quatro foram flagrados por
câmeras de segurança carregando sacolas de documentos que incriminariam Paulo
Roberto (essas imagens, inclusive, você vê à direita na imagem acima).
Brasília: o núcleo mais
esperado
É nas paródias dos políticos
que a série tem sua veia mais cômica.
Naturalmente, foi a parte mais polêmica.
A série, porém, pega mais pesado com
Aécio do que com Dilma e Lula.
Cheio de tremeliques, drinks e mãos bobas, o senador
mineiro surge praticamente como um vilão de desenho animado.
Ex-Presidente João Higino /
Lula A maior polêmica na repercussão da série se refere à frase de Jucá (“temos
de estancar essa sangria”), que em O Mecanismo foi parar na boca de Lula.
A
escolha gerou um ruído que poderia ter sido evitado.
Mas o Lula da vida real
foi até mais duro que o da ficção.
Chegou a dizer, no telefonema grampeado para
Dilma:
“Temos um presidente da câmara f… Um presidente do Senado f…. E fica
todo mundo num compasso de que vai acontecer um milagre e salvar todo mundo”.
O
Lula da série é mais calado e reflexivo que o de São Bernardo.
Talvez a cena
mais forte que envolve sua versão ficcional, o João Higino, não seja a da fala
da “sangria”, mas uma em que ele recebe de presente o triplex, imóvel que seria
o pivô de sua condenação na vida real.
Não é à toa que Lula chama
“Higino” na série.
Esse é o nome de de um escravo da Roma Antiga que, depois de
liberto pelo Imperador Augusto, virou funcionário público de alto escalão.
Presidenta Janete / Dilma
Roussef
Depois de receber críticas
de Dilma pelo transplante da fala de Jucá, Padilha chegou a dizer que a petista
“não sabia ler”, já que existe um disclaimer antes de cada episódio dizendo que
a série é uma obra de ficção.
O cineasta, porém, foi mais suave no trato com
Dilma dentro da série do que fora.
Tirando uma piada logo no primeiro episódio,
em que a mandatária anuncia uma tecnologia da Petrobras para “estocar vento”,
não há referências aos discursos mal ajambrados ou à recessão econômica – que
já tinha começado em 2014, quando acontecem os fatos centrais da série.
O
roteiro até diz que o melhor para a Lava Jato é a reeleição de Dilma.
Não por
ética da ex-presidente, mas por soberba, já que ela se entenderia como inatingível.
Ainda assim, sua manutenção no poder aparece como algo positivo para a
continuação da Lava Jato.
O impeachment, que começa a ser maquinado nesta
temporada, é retratado como uma trama movida por Aécio e Temer para estancar a
operação da PF.
Lúcio Lemes / Aécio Neves
Se os apoiadores de Lula e
Dilma partiram para a briga contra a Netflix, com Aécio não teve nada disso.
Mas não se engane: a série foi atômica contra o mineiro.
Nas primeiras cenas em
que o tucano surge, o narrador avisa que se trata de um bandido. Ponto.
Depois
piora: Aécio aparece como um alcoólatra terminal e viciado em anfetaminas.
Se
ninguém reclamou da forma como Aécio é retratado, então, só há um diagnóstico:
o tucano está morto para a política – na vida real, foi pego pela Operação Patmos,
uma braço da Lava Jato.
Frederico Pacheco, primo do tucano, foi filmado
recebendo R$ 2 milhões da JBS.
Aécio tinha sido gravado combinando com Joesley
Batista a entrega desse mesmo dinheiro ao primo, num telefonema em que diz ao
dono da JBS, como adendo humorístico, que Fred era um bom comparsa, já que
“seria fácil matá-lo antes de uma delação premiada”.
13 homens e muitos segredos:
os empreiteiros
A série é fiel à linha do
tempo das delações das empreiteiras.
A primeira grande delação foi a de Augusto
Ribeiro de Mendonça Neto, dono da Toyo Setal engenharia.
Foi ele, que aparece
na série como o fumante inveterado Silvério, que contou à PF sobre o “Clube das
Empreiteiras”.
Na série, ele é chamado de “Clube dos 13”, em referência ao
sindicato dos maiores clubes de futebol do país.
Na vida real, eram 16 as
empresteiras cartelizadas.
Como mostra Silvério/Augustro, as maiores
construtoras do País combinavam preços e dividiam entre si as grandes
licitações de obras públicas, principalmente aquelas que envolviam a Petrobras.
Uma das empresas membro do clube, a Galvão Engenharia, deu origem ao melhor
trocadilho da série.
Virou “Bueno Engenharia”.
A derrocada da rainha das
empreiteiras, a Odebrecht, começou como os últimos episódios da temporada
insinuam: com a delação de Maria Lúcia Tavares, secretária de Marcelo Odebrecht
(que quem não encerrou a conta da Netflix verá atrás das grades na próxima
temporada).
Ricardo Pessoa, da UTC, teve um destino mais suave: depois de
delatar duas dúzias de políticos ganhou na hora o direito de cumprir sua pena
de 8 anos em casa.
Leo Pinheiro, da OAS e do triplex, teve sua pena reduzida de
10 anos para 3,5, em regime semi-aberto, após depor contra Lula.
*grifos no texto nosso
post: Marcelo Ferla
fonte: https://super.abril.com.br/cultura
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