O beijo da morte
A muito não escrevo no blog. Estava desgostoso com os assuntos que lia nos mais variados meios de
mídia, eram assuntos repetitivos, pessados que pareciam estar atolados em um mar de
lama, sempre insolúveis.
Mas confesso que alguns
motivos me fizeram quebrar o silêncio, infelizmente por um motivo ruim, triste, macabro e bizarro.
Tenho dois irmãos, um de
28 anos e outro de 21 anos. Ambos são frequentadores de casas noturnas. Mais do
que isto, o de 21 anos, está com um de seus amigos de infância internado no Hospital
da Ulbra em Canoas. O irmão é um dos que se encontra em estado grave. Já devem saber do que vim tratar aqui.
A queda de um avião com
vítimas, jamais ocorre por um único motivo, diria o grande escritor Ivan
Sant’Anna. A exemplo deste tipo de fatalidade, o que ocorreu na boate Kiss, não
foi diferente.
O que ocorreu na boate
Kiss em Santa Maria, todos já sabem. A morte de 234 jovens, 121 pessoas
internadas, sendo destas 87 em estado grave, até o momento.
A porta não deveria ser
uma só, apesar de haver legislação não obrigando a exigência de mais portas,
declarações do Major do Corpo de Bombeiros dizendo que a boate estava em estado
regular para funcionamento, que a fiscalização fora feita, que a falta de
fiscalização existe, que a prefeitura em nada tem haver com isto, que o Corpo
de Bombeiros em nada te haver com isto, alegando hoje, que as pessoas deveriam ter cuidado mais onde estavam indo e os lugares que frequentam, que o artifício utilizado pelo vocalista
e que iniciou o incêndio, a custo de R$ 2,50 era de uso externo, sendo que o interno,
como deveria ser, custa R$ 150,00, economia porca, pessoas pisoteadas, os corpos que tiveram que ser pisoteados para serem retirados, os jovens que se prenderam nos banheiros, por que para estes que correram em direção a estes, a luz que vinha de lá, era a luz da
saída do local, os celulares que tocavam em cima dos corpos estirados das vítimas
intoxicadas, toques estes que eram de parentes, mães, pais, irmãos e familiares,
atrás das pessoas que já não estavam mais entre nós, a mensagem da menina que
faleceu mandando uma mensagem via celular onde se leu: “KISS, socorro.”, amigos,
seres humanos que estavam a festejar, os que saíram da boate, mas voltaram para ajudar e
procurar os que não encontravam e que, fazendo isso, morreram como heróis nesta
tentativa desesperada, a filha de 19 anos morta no lugar da mãe que trabalhava no local, os
seguranças, que sem nenhuma tolerância, humanidade e competência, não permitiram
a saída dos tantos desesperados que lá dentro estavam, por serem naquele
momento, caloteiros, mal pagadores e assim, foram barrados, um
local que não tinha capacidade para a quantidade de frequentadores que lá
estavam na noite fatídica, um extintor, usado por um segurança para apagar o
fogo no foro e que pode ser falsificado, a falta de sinalização para a saída, o sistema de isolamento acústico altamente inflamável, os milhares de parentes,
lotando um ginásio, para reconhecer 234 corpos enfileirados, um sistema
logístico de guerra, psicólogos, aviões com medicamentos e vítimas, assim como
helicópteros.
Pronto. Estava feito. O
nosso Rio Grande do Sul, o nosso Brasil, estava em todas as capas do mundo que
traziam em claras letras a segunda maior tragédia do Brasil e a terceira maior do mundo no que
se refere a acontecimentos desta natureza em boates/locais de entretenimento.
Somos recordistas da
discórdia, da indiferença, da banalidade, do macabro, do maldito, do maldito dinheiro, do lucro, do status de
quem ostentava ser proprietário de uma câmara de gás idêntica as utilizadas no início da
II Grande Guerra, no começo do que veio a ser conhecido como e chamado pelos nazistas de "Solução Final", onde canos de descarga de caminhões que traziam judeus, tinham seus canos de descarga ligados a uma mangueira grossa que despejava monóxido
de carbono dentro de peças sem janelas e de portas trancadas, câmaras de gás.
A diferença é praticamente
nenhuma, por ambição, por poder, o homem gera o macabro, sem dó nem piedade, tirando vidas como se nada valessem.
As informações são muitas,
não estão em ordem, não me preocupo com isso, me preocupo com o que está
acontecendo hoje, quarta-feira, véspera de fim de semana que, quando chegar,
levará milhares de jovens a calabouços da morte como a KISS.
Outro fato inadmissível e
que alguns podem não estar entendendo é minha atitude nas redes sociais como o
facebook, ao reiteradamente, postar materiais a respeito do ocorrido e de minha revolta.
Faço isso por todos
aqueles que faleceram dentro deste maldito lugar, pela mãe que hoje, perdeu seu
segundo filho, visto que já havia perdido um, portanto, dois filhos em três dias e o
marido a dois anos atrás, pela mãe que esteve hoje pela manhã em frente a boate
a apedrejou, indignada por ainda não entender como que um lugar como aquele não era
adequado para ser jovens se divertirem e sim, para morrerem.
Faço isso, pelo rapaz (Guilherme) falecido hoje que
saiu da boate salvo e voltou, retirando 14 pessoas lá de dentro, faço pelas lágrimas secas dos parentes, irmão, mães, pais e
amigos que não tem mais forças para suportar a dor da perda de uma vida recém
iniciada, faço pelos futuros profissionais, brilhantes que poderiam ser, as vítimas do
acontecimento macabro que tem entre os que se foram, mais da metade composta por
estudantes da UFSM, pelo capitão do Corpo de Bombeiros, também pai, que retirou mais de 180 corpos, somente dos banheiros, pelo trauma do que estas pessoas todas ouviram, viram e
presenciaram e que com certeza absoluta, nunca, mas nunca mais, esquecerão o que
aconteceu nesta maldita e macabra madrugada, por uma cidade que esgotou suas flores e
seus caixões, por uma cidade inteira que caminha de branco sofrendo a passos
pesados como se estivesse na própria via sacra, por aqueles que ofereceram suas
casas, camas, sua comida, seus carros para transporte, tudo para desconhecidos, desesperados e desesperançados desconhecidos.
Não se enganem ao pensar que este problema não é nosso.
Todos nós temos alguém,
parente ou não em idade de frequentar locais como a Kiss. Posso afirmar a vocês,
assim como disse hoje, o Prefeito de Porto Alegre Fortunati, ao declarar que
seis grandes boates da capital estão fora da legalidade, sem fiscalização e sem condições de funcionamento.
Chamo atenção para um detalhe, o Prefeito de nossa capital não quis os nomes das casas noturnas que trazem risco, sob a alegação de não querer causar pânico.
Prefeito, por Deus Prefeito Fortunati, causar pânico e tortura é o ato de não vir a público avisar os
cidadãos de sua cidade dos locais que eles não devem ir para que não ocorra
outra tragédia como a que presenciamos.
Como se não bastasse o já
ocorrido, um dos donos tenta se matar no hospital com uma mangueira de
chuveiro, o Secretário Geral do Governo diz que a responsabilidade de
fiscalização não é da Prefeitura de Santa Maria, e sim do Corpo de Bombeiros e, o Corpo de Bombeiros, por sua
vez, diz que a Prefeitura é que tem responsabilidades, protagonizando ambos o jogo do empurra.
As imagens do circuito
de segurança composto por câmeras de vídeo e que ficam guardadas em um
computador, nada encontrado na perícia, os presos que supostamente já são tidos,
antecipadamente, como aqueles que sumiram com a sujeira toda, as jogaram debaixo da fuligem e dos destroços da Kiss.
Definitivamente, o ar de
descrença, de impunidade, desrespeito e indiferença das autoridades para com o
ocorrido e seus envolvidos diretos e indiretos, não pode contaminar as
investigações e a futura responsabilização cível e criminal de quem quer que seja, autoridades públicas ou civis.
Os culpados tem que pagar
pelo que ocorreu, tem que pagarem por um trauma de tamanha proporção que o
apoio dado aos traumatizados, os que choram a perda dos seus é semelhante ao dado aos sobreviventes e parentes de vítimas de 11
de setembro nos EUA.
Todos nós, brasileiros, gaúchos, não podemos ceder em momento algum, não podemos afrouxar o nó para que tudo termine em nada, devemos apertá-lo, até o último momento, para que até o fim o legal e o correto finalmente apareçam a se sobressaiam.
Se a legalidade não
ocorreu até a tragédia é hora de fazer com que a legalidade prevaleça e impere
sobre tudo que ocorreu com a punição, reitero, de todos os responsáveis,
pessoas públicas ou civis.
Por fim, gostaria de agradecer pessoalmente aqui a
todos que de alguma forma ajudaram e ainda ajudam estas famílias desorientadas, destruídas e traumatizadas ao máximo, violentadas em suas vidas pela perda brutal e
estúpida de pessoas que amavam, de jovens pessoas que tinham muito a oferecer,
mas que por ambição e sentimentos como este, tiveram de si arrancados estes jovens e seus futuro.
Aos municípios e capitais
do Brasil e aos países irmãos que estão enviando materiais e profissionais para
o melhor atendimento dos que ainda lutam por suas vidas e pelos parentes das vítimas que precisam mais do que nunca de um amparo sem limites.
Que as almas destes jovens
descansem em paz e que Deus ilumine e dê forças para os que ficaram, que suportem esta dor que
não pode ser medida.
P.S – ESTE TEXTO NÃO FOI
CORRIGIDO, PEÇO DESCULPAS PELOS POSSÍVEIS ERROS GRAMATICAIS E DE PORTUGUÊS, MAS NÃO QUIS
LÊ-LO NOVAMENTE.
Marcelo Ferla
Perfeitooo!!!
ResponderExcluirÉ, eu vi qnd aconteceu, uma tragédia sem tamanho, tenho amigos aí do Sul q tbm perderam amigos neste dia... e seu texto arrancou-me novas lágrimas, um texto coerente, q em nada deixa a desejar, gostei da paixão com q escreve e assim sendo, a matéria, ou mesmo esta matéria como a da Kiss, passa a ter alma, é um degustar de cada linha pulsante, seu texto emociona, pois já é carregado de tristeza e vem com essa dose dobrada, numa avalanche de sentimentos teus que querem se fazer ouvir... e por fim, conseguem seu merecido espaço.
ResponderExcluirContinue escrevendo com paixão Marcelo, pq isso sentimos e é justamente oq nos atrai.