
Vida e Morte do MST
“O que matamos não foram pessoas comuns. Eles foram contratados para matar, eram pistoleiros violentos.”
Jaime Amorim, um dos lideres do MST na área em Pernambuco.
Lembro-me muito bem da primeira vez em que tive um contato mais profundo, por assim dizer, com o assunto Reforma Agrária e MST: Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terras. Tal contato se deu por meio da cadeira de Direito Agrário que cursava quando da época em que estava na faculdade de Direito, mais especificamente no ano de 2001.
Jamais me esquecerei de uma das frases que meu Mestres àquele tempo, lançou em sala de aula para aqueles aspirantes a futuros trabalhadores em prol do Poder Judiciário de nosso País. Assim disse ele: “Muitas vezes já estive em assentamentos de sem terras e juro a todos vocês, jamais, mas jamais, vi algo tão organizado e bem estruturado, dentro das condições em que aquelas pessoas se encontravam em toda a minha vida”.
Aquilo entrou como um torpedo em meu ouvido, até porque tinha uma imagem de tais pessoas como sendo pessoas paupérrimas, em condições mínimas de higiene no meio de campos lamacentos em decorrência da falta de estrutura geral. Vim mais tarde, e com um pouco mais de experiência, a saber, que não se tratava de nada disso e que aquilo que pensava sobre aquelas pessoas em nada tinha haver com a realidade em que estes mesmos já viviam.
Talvez tenha sido enganado pela história de minha família, que através de meus avós maternos, era formada por colonos fugidos da II Guerra e que se acomodaram em um pouco pedaço de terra desse Estado do Rio Grande, sofrendo muito para conquistarem o que possuem hoje. Mas voltemos ao assunto do MST.
Trata-se o MST, a princípio, em um conceito bem a moda de compêndios, de um movimento social brasileiro de inspiração Marxista cujo objetivo é a implantação da reforma agrária no Brasil, tendo origem na aglutinação de movimentos que faziam oposição ou estavam desgostosos com o modelo de reforma agrária imposto pelo regime militar, principalmente na década de 1970. Contrariamente a este modelo, o MST de hoje declara buscar a redistribuição das terras improdutivas.
Ainda proclama-se como herdeiro ideológico de todos os movimentos de base sociais camponeses ocorridos desde que os portugueses entraram no Brasil, quando a terra foi dividida em sesmarias por favor, real, de acordo com o direito feudal português, fato este que excluiu em princípio grande parte da população do acesso direto a terra.
Todos os movimentos de base sociais camponeses ocorridos desde que os portugueses entraram no Brasil. Tudo muito politizado e belo como ideologia.
Muitas foram às lutas travadas onde tínhamos como objeto principal a ocupação de terras, passando pelo “Movimento Messiânico”, ligado ao catolicismo, depois pelo “Movimento Contestado”, ocorrido no Estado de Santa Catarina, pelo Movimento liderado pelo lendário Lampião no Nordeste de nosso país e por fim as chamadas “Lutas Radicais Localizadas”.
Estas chamadas “Lutas Radicais Localizadas” (1940-1955) consistiam, basicamente, em diversos conflitos violentos por terras e revoltas populares, em diversos lugares do Brasil, em lutas não mais de cunho messiânico, mas agora com demandas sociais e políticas claramente definidas como tais. Estas lutas, embora localizadas, tiveram a adesão de milhares de pessoas, e em alguns lugares, como no Maranhão e no Paraná adquiriram tal magnitude que os camponeses tomaram cidades e organizaram governos paralelos populares.
Com isto a luta pela terra foi violentamente reprimida, sob pretexto de "ameaça comunista". Com isto, o movimento pela reforma agrária não pode atuar e a maioria de seus líderes foi ou preso ou morto.
Chamo a atenção do leitor para esta última fase, por que ao lê-la me pareceu como sendo, por meio de testes de DNA, o verdadeiro Pai e/ou Mãe dos movimentos que ocorrem nos dias de hoje, principalmente no modo como ocorrem, nos seus meios de abordagem e de atos daqueles que queriam e, hoje ainda querem, terras produtivas, latifúndios que alegam, na maior parte das vezes, serem improdutivos e passíveis de desapropriação para seu melhor aproveitamento.
A partir deste momento, passamos por períodos um tanto quanto conturbados, tanto na esfera social do país, quanto na esfera política, por mudança de Constituições e de seus respectivos textos que tratavam do assunto.
Profundo foi o diálogo acerca de tais fatos e da necessidade de uma reforma agrária, até que a Constituição de 1988, em seu texto legal, determinou a revalidação do princípio da desapropriação de terras mediante pagamento em títulos públicos (que já havia sido como já dito, admitida pela ditadura militar). No entanto, por força da pressão da bancada ruralista na Constituinte, limitou as desapropriações às terras improdutivas, conceito este de difícil avaliação prática, e que viria a constituir-se em obstáculo à reforma agrária em grande escala.
Desde a invasão da Fazenda Nonoai, no Rio Grande do Sul na década de 1970, momento em que se reformula o MST. Alguns afirmando, apoio político do PT e da Comissão Pastoral da Terra, o embate é ganho pelo MST que permanece assim na área invadida, expandindo-se ao mesmo tempo em âmbito nacional.
A partir daí levanta-se uma bandeira na luta por ocupação de terras improdutivas como forma de pressão pela reforma agrária, mas também há reivindicação quanto a empréstimos e ajuda para que realmente possam produzir nessas terras.
Já naquela época era muito importante para o MST que as famílias pudessem ter escolas próximas aos assentamentos, de maneira que as crianças não precisassem ir à cidade e, desta forma, fixar as famílias no campo.
O MST se organiza em 24 estados brasileiros. Sua estrutura organizacional se baseia em uma verticalidade iniciada nas brigadas (compostas por 50 famílias) seguida pelos núcleos (grupo de 200 famílias), havendo, direção regional, direção estadual e direção nacional.
Paralelo a esta estrutura existe outra, a dos setores e coletivos, que buscam trabalhar cada uma das frentes necessárias para a reforma agrária verdadeira. São setores do MST: Saúde, Direitos Humanos, Gênero, Educação, Cultura, Comunicação, Formação, Projetos e Finanças, Produção, Cooperação e Meio Ambiente e Frente de Massa. São coletivos do MST: juventude e relações internacionais. Esses setores desenvolvem alternativas às políticas governamentais convencionais, buscando sempre a perspectiva camponesa.
A organização não tem registro legal por ser um movimento social e, portanto, não é obrigada a prestar contas a nenhum órgão de governo, como qualquer movimento social ou associação de moradores. A maior instância da organização é o Congresso Nacional, que acontece a cada cinco anos.
No entanto, este congresso é apenas para ratificação das diretivas, não é um momento de decisões. Os Coordenadores e os Dirigentes Nacionais, por exemplo, são escolhidos no Encontro Nacional, que acontece a cada dois anos.
A Coordenação Nacional é a instância operacional máxima da organização, contando com cerca de 120 membros. Embora um dos principais dirigentes públicos do movimento seja João Pedro Stédile, a organização prefere não rotular alguém com o título de principal Dirigente, já que isso seria uma personalização; o MST adota o princípio da direção colegiada, onde todos os Dirigentes têm o mesmo nível de responsabilidade.
O movimento recebe apoio de organizações não governamentais e religiosas, do país e do exterior, interessadas em estimular a reforma agrária e a distribuição de renda nos países em desenvolvimento. Sua principal fonte de financiamento é a própria base de camponeses já assentados, que contribuem para a continuidade do movimento.
O MST articula-se junto a uma organização internacional de camponeses chamada Via Campesina, da qual também faz parte o Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) e agricultores da Europa, EUA, África, Ásia e Américas.
Há que se ressaltar que existem duas formas básicas de se fazer a distribuição de grandes latifúndios aparentemente improdutivos, sendo estes a Reforma Agrária, que lida com desapropriação e indenização de terras na forma da lei e a chamada Revolução Agrária que faz a sua própria reforma, a seu modo, uma vez que usa de força e nada mais.
Definitivamente nos salta aos olhos que a forma utilizada pelo MST, pelo menos nos últimos anos é a da Revolução Agrária, fato este alicerçado em uma série de acontecimentos em que nada tem haver com o que a lei determina e muito menos com os próprios princípios trazidos pelo MST, inicialmente, como um movimento popular em favor de uma distribuição de terras justa. Mas porque essa distorção entre conceitos e atos é tão grande dentro deste dito movimento popular?
Inicialmente me parece que o próprio MST, em decorrência de uma série de acontecimentos ocorridos ao longo dos tempos, como a invasão e depredação de parte do Congresso Nacional, ato este liderado pelo MSLT no ano de 2006, onde pessoas ficaram feridas, bem como, equipamentos foram destruídos, a Invasão da Fazenda Euclides da Cunha, resultando no ferimento de um membro do MST por bala. Continuamos o martírio, mais nove integrantes do MST baleados em Piranhas (AL) em decorrência de invasões.
Por fim, mais recentemente, chegamos a Fazenda Jabuticaba, no Estado de Pernambuco, onde há pouco tempo atrás ocorrera a morte de Wagner Luís da Silva, um dos homens, dentre cinco no total, que faziam a segurança de uma das Fazendas ameaçadas de invasão em Pernambuco, deixando este, mulher e filho pequeno. Dentre estes cinco homens, somente João Arnaldo da Silva era segurança de ofício, os demais faziam “bico”.
João Arnaldo da Silva estava à frente da discussão com os ditos sem terra, quando, de repente, um dos integrantes do movimento, puxa uma arma e atinge João na perna, bem como Rafael Erasmo da Silva.
Depois de terem sido atingidos, ambos, por dois tiros, respectivamente, um na perna de cada um deles, receberam mais um tiro, cada um, ambos fulminantes, na cabeça, deixando-os mortos.
Enquanto isso, Wagner, nesse momento ainda vivo, Wedson e Donizete, correram, sendo os três literalmente caçados mata a dentro como animais pelos membros do movimento. Somente Donizete conseguiu escapar.
Wagner e Wedson foram alcançados pelos caçadores, e, como já se sabe, foram mortos como se fossem animais, o primeiro com um tiro na perna, e dois na cabeça sendo um deles na nuca e o segundo recebera dois tiros no rosto, estavam mortos.
A muito vem se questionando, no que se refere ao MST, tanto as pessoas que fazem parte desse movimento, quanto os métodos que vem sendo internamente ensinados e empregados nos acampamentos, ocorrendo boatos, até então, da ocorrência de uma espécie de lavagem cerebral em crianças de escolas itinerantes pertencentes aos acampamentos em prol do movimento e contra os vilões latifundiários, o ensinamento de táticas de guerrilha entre os membros do MST, e, por fim, um apoio financeiro, que já vem a muito sendo investigado e que mantêm toda essa poeira levantada
A reforma agrária, e vejam bem, não sou especializado no assunto, corresponde a uma melhor forma de divisão de terras para fins de produções agrárias das mais variadas, fazendo com isso, com que não haja latifúndios inúteis nas mãos de poucos e terras produtivas nas mãos de muitos.
Como se trata de um assunto que possui raízes políticas e interesses dos mais conflitantes e adversos de ambos os lados, deve ser tal assunto tratado na mesa, sem foices e armas, com pessoas de ambos os lados que sejam civilmente capazes, lúcidas, portanto, cumpridoras de seus deveres e que mais do que tudo isso, queiram que a reforma agrária ocorra sem nenhum interesse a mais do que não o de fazer com que o País prospere como um todo nesta área.
Ocorre que o número de distorções nessa área ocorre em demasia e repetidamente. Pessoas pertencentes originalmente ao MST já ocupam cargos públicos com o único intuito de puxar a brasa para o seu assado, o MST.
Ocorrem desvios de dinheiro nos repasses de valores de origem federal, inicialmente para apoiar um inicio de reforma agrária, que caem nas mãos de pessoas e não de movimentos para a reforma agrária, segundo investigações da Policia Federal, assentados do MST que recebem sua gleba de terra e depois disso as colocam a venda, comercializando lotes que deveriam servir a reforma agrária, ou seja, existe de uma forma geral, uma anarquia dentro da anarquia. E por fim, os que lá estão, nos assentamentos, fazendo parte do MST são todos eles agricultores? A resposta é não.
Definitivamente este não é o modo nem o modelo ao qual se deve sujeitar a análise um assunto como a reforma agrária, que sequer vem sendo visto da forma que merece, fazendo com que, dessa forma, se sobrepujam a violência, a morte, o caos completo, uma imobilidade irritante e que mais, custa caro a muitos, como custou à Família de Wagner Luís da Silva. É preciso diálogo, cooperação e vergonha na cara de ambos os lados, para aí sim a coisa acontecer, caso contrário essa reforma continuará se arrastando prestando serventia somente a quem convém.
Por fim, a respeito da frase lá de cima, dita por Jaime Amorim, um dos Líderes do MST, Wagner Luís da Silva era um mero moto-taxista da cidade de São Joaquim do Monte, querendo ganhar um pouco mais para sustentar sua família e provavelmente se ameaçado, sentiria medo e jogaria a arma, se é que tinha uma, no chão sem fazer mal a ninguém.
Texto: Marcelo Ferla
Edição: Michelle Jefinny
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