24.6.09
Os Quatro Cavaleiros do Apocalipse.
Muitos sabem, através da leitura do livro de José contido na Bíblia, sobre o Apocalipse (Apocalipse 6:1-8) que são Quatro os Cavaleiros do Apocalipse, sendo eles, a peste, a fome, a guerra e por fim a morte.
Na verdade não sou católico praticante, tenho meu próprio Deus ao qual oro todos os dias no horário em que tomo banho, um momento especial entre nós dois. Digo isso, porque muitos dos dogmas empregados pela Igreja Católica não recebem minha simpatia ou apoio e também porque não gosto de coisas que não acompanham o seu tempo de forma teimosa.
Mas não é disso que pretendo ficar aqui escrevendo linhas e linhas, até porque não sou um aficcionado por catolicismo como já disse.
Vim até aqui falar de algo que vem me deixando por demais preocupado e impressionado principalmente, que vem tomando proporções que eu, nos meus poucos 30 anos de idade já vividos, jamais tinha visto, e olha que estou vivendo em tempos que muita coisa já aconteceu em um curto espaço de tempo.
Essa coisa me fez ver situações que confesso de forma talvez até ingênua, somente ter visto em documentários e filmes policiais e sobre o assunto.
Mães que amarram os pés dos seus filhos e filhas em pés de camas com uma corrente para que não fujam, filhos que abandonam as escolas em que estudavam, perdem a dignidade e o amor próprio por algo que julga maior, tornam-se animais, uma Mãe que, desesperada com a violência física e psíquica que sofre oriunda de seu filho, chega ao ponto de matar a sua criação com vários tiros, a sujeição à prostituição como moeda de troca, a prática por estes filhos de atos criminosos de grande gravidade, furtos, roubos, latrocínios, dentro e fora de casa, rapazes que são internados com dedos das mãos amputados por traficantes em decorrência de uma dívida de R$ 10,00 (Dez Reais).
A escalada, muitas delas até o pico, é rápida, sendo esta determinada pelas influências e necessidades (fraquezas) do dia-a-dia, da falta de estrutura social e principalmente de estrutura familiar, procurando-se assim, o poder maior, o que não se tem em casa, do ser mais, do estar bem, do estar além.
Esta escalada começa, isso não é regra que fique claro, com o cigarro, droga dentre as chamadas lícitas, ligado este sempre há muito charme, muita auto-suficiência, e que é o primeiro degrau de ocupação em uma escala na hierarquia entre os “amigos” e chegados, droga esta que mata tanto quanto qualquer outra, aliás, será um páreo duro em se falando de morte daqui para frente neste texto.
Vamos à segunda etapa, a bebida alcoólica. Aqui o furo já é mais embaixo, mas a subida na hierarquia entre os “amigos” é muito maior, assim como a coragem, que como em um toque de mágica aumenta, fica maior, “a mina gata pra caramba” fica mais próxima, dançar já não é mais motivo de vergonha, o cara se solta, é “o cara”, está fazendo coisas jamais vistas e pensadas, sensações mil, que loucura, que “vibe”. A cada saída, a cada danceteria, mais e mais bebida, mais e mais coragem, fica mais descolado, mais esperto.
Passamos à terceira etapa, a maconha. Neste momento ocorre um pequeno problema inicial, a crise existencial entre usar o que pode o que é vendido em qualquer boteco e o que é proibido, é mal visto, a maconha, ser maconheiro, que horror. Ledo engano, o caminho já está sendo traçado.
O convencimento em cima do encorajamento, do “barato” e da viagem muito mais doida e prazerosa, combinadas com os feitos incríveis proporcionados pela bebida levam nosso personagem a dar mais um passo a frente. Na hierarquia, ele já ocupa um lugar bacana, muita festa, euforia, risadas, diversão, o tempo para, as idéias vem a mil, mais se pensa do que se fala, o coração dispara, “cara que doideira, to numa outra vida, posso tudo, estou me amarrando nesse lance, era tudo que eu queria, liberdade, capacidade, carisma, estou demais assim”. A esse ponto nosso “amigo” já potencializa o efeito do álcool, já não toma mais algumas doses, mas várias, garrafas inteiras para manter o nível da “vibe” e do “agito” tudo muito bom. Mas as coisas evoluem cara, a viagem pode ser maior, mais longa e mais poderosa, mais influente, como diria meu amigo Luiz Fernando Nascimento: “isso é o romantismo da droga, cara”, aí está ela em sua totalidade.
O tempo passa, o uso é contínuo, o corpo não é tão atingido, pois temos um puro sangue, jovem, corre bem, agüenta o tranco, não é mais “o cara”, ele é o Rei, o Rei dos “amigos”, é diferenciado.
Vamos nessa amiguinhos, a viagem está indo de vento em popa, nosso amigo já é conhecido como o “Rei da cocada preta”, isto porque ainda não conheceu a “cocada branca meu irmão”.
Um dos amigos, em uma determinada festa, daquelas, sabe como é, belas mulheres, batidas das músicas que atravessam o corpo, alguns baseados já fumados antes e durante e muito álcool, vem e mostra algo que na luz negra quase queima as retinas, “Cara que bagulho é esse?, esconde isso, é o que estou pensando?, diz o nosso amigo.
Aquilo brilha mais do que a roupinha da gogogirl, “Está maluco entrar aqui com isso?”, diz novamente. O amigo prontamente lhe apresenta a mais requintada das drogas antigas, aquela que dominou as danceterias, os filmes policiais, a elite, “os caras mesmo, os bons, usam dessa meu irmão”, diz o parceiro, essa te leva as alturas, tu nunca esteve onde ela vai te levar”, complementa. E lá vai ele mais uma vez, “não, daí já é demais meu, pó, pó não meu, tão pegando pesado demais, tá loco”. “Larga de ser mané e dá um tapa aí”.
“Tá vendo aquela mina lá no meio da pista, que tu tá muito afim e me disse que faria tudo por ela? Pois é, ela curte disso e, pra chegar até lá e muito mais longe, sem medo, sem angústia, sem sofrimento, na boa, dá logo esse tapa aí e manda ver”. E lá foi ele, cheirou, o mundo girou, ele ficou amortecido, fica eufórico, tem a plena sensação de poder, medo e ansiedade não existem, fica agressivo, não tem pra ninguém, a excitação física, mental e sexual, UAU! a mina da pista que ele queria, é total, comer já não é mais necessário, dormir tão pouco, o coração bate a mil por hora, parece que vai explodir, dá uma vontade de ir ao banheiro, até porque a cerveja que ele já tomou e o pó que está cheirando lhe torna um verdadeiro campeão no que se refere a tempo utilizado para urinar, treme, mas é bom, compensa, a pupila dilata, a sede aumenta, vamos tomar todas hoje e ficar com a “mina” dos meus sonhos mais uma vez.
Mais um passo, mais respeito entre os “amigos”, os “parceiros”, é como se cada cheirada fosse uma conexão com outro mundo, como no filme Matrix, onde os personagens a serem logados a tubos ao longo de sua coluna, entram em uma dimensão em que se sabe de tudo, pode-se tudo, nada é intangível, nada os derruba nada dá dor, desviam até de balas, ele, nosso amigo, é quase Deus, quase.
Mais tempo se passa mais se cheira mais se entra no mundo do tudo pode do nada é proibido, somos o que há na balada, pensa nosso amigo, jovens, bonitos, seguros, copos cheios até a boca, nariz nervoso, dançamos, transamos, dirigimos, batemos em todos, mandamos em tudo, conhecemos os bandidos, são nossos “parceiros”, podemos.
Depois de um tempo assim, as coisas mudam de lugar vagarosamente, mas não o suficiente para parar, alguns percalços somente, “alguns tetos”, convulsões, overdose, o efeito parabólica começa a aparecer, tudo que faz subir, faz descer e a descida não é nada boa, o bicho pega, e pega feio, mas e aí?, eles podem, ainda acham que podem.
Até que o “parceiro” chega com boas novas. “Cara tem um esquema aí, mais barato, mais doido, que vai fazer passar tudo isso que tá pegando na gente, é fácil de achar e muito, muito doido, por quase nada a gente pega, custa barato pacas, tira tudo de ruim do cara, suor, delírio, falta de memória, todas essas paradas aí, é um remédio dos Deuses”.
“E como se chama essa parada?”, diz nosso amigo. “Tô precisando, tô mal, quero que tudo seja como era lá no início, festas, mulherada, manda logo isso aí, como é o nome?” Diz logo, complementa. “É o Crack cara, barato e doido, te dou garantia”, argumenta o “parceiro”.
Vem à primeira pedra e com ela o cachimbo, e com os dois mais uma vez, a sua ação sobre o sistema nervoso central, aceleração dos batimentos cardíacos, aumento da pressão arterial, dilatação das pupilas, suor intenso, tremores, excitação, maior aptidão física e mental, efeitos psicológicos como euforia, sensação de poder e aumento da auto-estima. Parece estar tudo bem novamente, mas não, a dependência é muito forte, é preciso vinte, trinta pedras por dia.
Este é o capitulo final, O FIM, chega-se ao topo e do topo cai-se, sem escala, direto. Muito mais rápida do que foi a subida será a descida, com muito mais dor, mais violência, mais sofrimento, depressão, angústia, medo, impotência e morte.
Passa nosso amigo a ser o bicho, não o Bicho Homem, nem “o bicho” da gíria, mas sim o bicho animal, que não toma mais banho, que não quer mais saber da família, somente de seus pertences para aquisição da pedra maldita, que não se cuida para nada, que dorme na rua, que leva a casa toda até a boca, que bate na Mãe, no Pai, no irmão(a), no cachorro, porque quer o elixir, o elixir da morte certa, a pedra, a maldita pedra da morte, que em menos de doze segundos causa extrema euforia e autoconfiança, assim como a dependência imediata ao seu uso. Quanto aos “parceiros”, ah!!!!! os “parceiros” ou morreram ou estão presos ou desapareceram.
Os “parceiros” de maior sorte tentam esta sorte em uma nova vida o que é quase impossível, mas tentam, através de apoio das suas famílias que apesar de tudo, apóiam, juntamente com a sociedade que precisa apoiar, juntamente com especialistas na área que precisam apoiar, juntamente com uma internação adequada que precisar ser eficaz, juntamente com os novos parceiros de clínica que ajudam parceiros estes agora sem aspas porque são companheiros, amigos, família, e não falsos urubus em torno da carniça prestes a apodrecer.
Quanto aos Quatro Cavaleiros do Apocalipse, o nosso amigo, o da nossa historia aqui, provou de todas as suas chagas, a Peste, da qual não se consegue livrar, a Fome, que mesmo com comida não se têm; a Guerra, ora nos morros, ora contra a maldita droga que retirou sua vida e de alguns “parceiros” levou esta vida, todos, sem exceção, por não terem o apoio apropriado, a proximidade e a conversa apropriada com os pais ou por desconhecimento ou porque já estavam sós a muito, abandonados.
Mas há um dos cavaleiros que não tolera volta, porque o que ele trás não tem volta, eis que é o da Morte. Somente quando o último cavaleiro (a morte) ergue em riste sua espada e golpeia sua vítima, é que não há mais solução a ser alcançada por nós mortais. Quanto aos demais, todos, sem exceção, são passíveis de derrota.
Precisamos lutar por aqueles que lá já se encontram e principalmente por aqueles que ainda não tiveram contato com tal maldição. Todos devem ajudar, o momento é de mobilização total, dedicação total, prevenir é a palavra e a família, no meu ponto de vista, chave mestra, auxiliada pela educação e pela sociedade como um todo.
É na família que os jovens vão encontrar o porto seguro para se manterem longe de coisas desse tipo. É mais do que necessário que estes saibam que há plena possibilidade de se ser “o cara”, “o bicho”, sem a utilização de tal arma fatal. Há como se conquistar a menina ou menino dos sonhos, há como tirar boas notas na escola, há como se destacar no esporte que pratica, há como ser conhecido por méritos em proporções e quantidades muito maiores que uma simples pedra.
O reconhecimento esta naquele que tem a força necessária para lutar por seus ideais de forma limpa, justa e principalmente honesta e inteligente.
Nada é mais gratificante do que ser um bom profissional, um bom esportista, sentir o gosto da vitória, da superação física e mental, do cansaço e da dor depois de um esforço sobrenatural. Viver não é o limite, ser alguém não é o limite, dar e receber alegria não é o limite.
O limite é ter preparo, carinho, afeto, diálogo com os pais, com os professores, com boas pessoas, é ter, na medida do possível o maior número de momentos felizes, sem complementos extras para atingir isso e isso é possível, erguendo pedra sobre pedra, uma de cada vez e não as consumindo.
Erga seu castelo, firmado em pedras fortes, duras, resistentes, pedras do tipo família, do tipo verdadeiro e bons amigos, amigos de verdade, do tipo estudo, educação, preparo, trabalho, dar e receber amor, paixão, música. Essas são as pedras de verdades, as fortes, as resistentes, as que resistem ao tempo e as dificuldades, porque não caem assim como seu Rei, verdadeiro Rei em seu belo castelo de pedras, lindas pedras, bem polidas, bem postas.
E lembre-se, não vale a pena destruir essa fortaleza por uma pedrinha que nada vale diante de tanto poder, de tanta satisfação, ou seja, a sua fortaleza, construída por suas mãos.
texto: Marcelo Ferla.
edição: Michelle Jefinny.
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