David Coimbra: queridxs
amigxs.
Colunista
escreve de segunda a sábado em ZH
Astrônomos descobriram que
um cometa vai cair bem em cima do Rio de Janeiro, esmagando a cidade inteira.
Mas não se preocupe, isso só acontecerá em 3 ou 4 milhões de anos, é possível
que nenhum de nós esteja vivo então, e que o Botafogo até já tenha sido campeão
da Libertadores, embora duvide que consiga ser do mundo.
Mesmo assim, fico
inquieto. Temos dificuldades com planejamento, no Brasil. Se deixarmos para os
últimos 10 ou 12 mil anos, é certo que as obras de remoção vão atrasar e que os
cariocas serão amassados pelo cometa, que nem o foram os dinossauros por aquele
meteoro que atingiu o México, há 65 milhões de anos.
Fico encantado com a
capacidade dos cientistas de descobrir essas coisas. Os cometas que caíram, os cometas
que cairão, e tudo mais. Eles sabiam sobre o eclipse da Superlua, no domingo
passado. Aquilo foi lindo.
A Lua se escondendo nas sombras na hora exata em que
os cientistas disseram que aconteceria.
Como eles são sabidos. Não
apenas os cientistas.
Hidráulicos e eletricistas, por exemplo, são detentores
de um conhecimento que me fascina. Além de tantos outros sábios, como o pessoal
do help desk e os mecânicos de carro.
Já eu sei de pouquíssimas
coisas. Uma delas é algo que aprendi sobre a nossa língua portuguesa: ela é
fonética, e isso é genial. Imagine que com apenas 23 sinais, representando
sons, somos capazes de expressar tudo que existe no mundo. Todos os
pensamentos. Todos os sentimentos. Todos os objetos e animais.
Posso escrever uma palavra
abstrata, algo que não existe, por exemplo: "Iglenho". Posso escrever
isso, e você saberá pronunciar. As escritas japonesa e chinesa são muitíssimo
inferiores à nossa, desculpem-me os entusiastas do Oriente. Porque são visuais,
são ideográficas, as pessoas têm de decorar milhares de símbolos.
Nossa escrita e nossa
língua, portanto, são pontos excelsos da evolução humana. Por isso, preciso
pedir às feministas que parem com essa história de escrever "amigxs"
em vez de "amigos", com a presunção de que estão lutando contra um preconceito
de gênero.
Quando vocês fazem assim, queridxs amigxs, vocês estão subvertendo a
lógica da língua portuguesa, porque ninguém consegue ler "axs mxxs carxs
amigxs", esse troço não existe. De onde é que vocês tiraram essa ideia?
"PresidentA" já é medonho.
Sou contra o impeachment, mas, quando ouço
alguém falar presidentA, tenho vontade de irromper Planalto adentro e derrubar
a Dilma a golpes de caneta.
A palavra "presidente" já é neutra, como
vocês querem: "o" presidente, "a" presidente. Tanto faz.
Aliás, o português, ou, se
vocês preferirem, "a" língua portuguesa, é, como o Direito, o
calendário e até o cristianismo, uma herança do Império Romano.
Deriva do
latim, e no latim existia esse gênero neutro.
Na língua portuguesa não existe,
mas nós temos os nossos lindos artigos: o "o", o "a".
Quando escrevemos "alunos", ao nos referirmos a moços e moças
estudantes, não é por machismo.
Há deslumbrantes palavras femininas que
designam os dois gêneros.
Um másculo carvalho sempre será uma árvore.
Qual a
semelhança entre ele e uma mulher?
Talvez porque ambos gerem frutos, o que não
deixa de ser uma poesia.
Aliás, a poesia, mais importante do que o poema, é
feminina.
E as cidades são femininas também, inclusive "o" Rio de
Janeiro, que será destruído por aquele cometa.
Não destruam também a
língua portuguesa, a nossa pátria, como diria Fernando Pessoa, a "última
flor do Lácio, inculta e bela", como diria Bilac. Viram?
Ela é a pátria,
ela é uma flor. Ela é uma menina!
Cervantes, que em espanhol
escreveu o primeiro grande romance do planeta, era apaixonado pela língua
portuguesa.
Chamava-a de "la Dulce". Doce. Como uma mulher. Como
vocês. Sejam doces com ela.
Não a maltratem. Por favor.
post: Marcelo Ferla
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