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quinta-feira, 20 de junho de 2013

Falando nisso.













Clóvis Rossi é repórter especial e membro do Conselho Editorial da Folha, ganhador dos prêmios Maria Moors Cabot (EUA) e da Fundación por un Nuevo Periodismo Iberoamericano. Assina coluna às terças, quintas e domingos no caderno "Mundo". É autor, entre outras obras, de "Enviado Especial: 25 Anos ao Redor do Mundo" e "O Que é Jornalismo". Escreve às terças, quintas e domingos na versão impressa do caderno "Mundo" e às sextas no site.

20/06/2013 - 03h00

O povo vai bem, o país vai mal

O cada vez mais imperdível Delfim Netto puxou para sua coluna de terça-feira no Valor Econômico uma pesquisa que talvez ajude a entender o que está acontecendo no Brasil.

Pena que a pesquisa seja de uma organização norte-americana, o Centro Pew de Pesquisas, e não de uma instituição brasileira, o que, por sua vez, talvez ajude a entender a perplexidade ambiente.

Enquanto estávamos anestesiados pela popularidade de Dilma Rousseff (e de alguns outros governantes), o Pew perguntou, em vários países, se o pesquisado estava ou não satisfeito com o modo como andavam as coisas. No Brasil, 55% responderam que estavam insatisfeitos (44% satisfeitos). Não por acaso, 55% foram os que disseram ao Datafolha, no início dos protestos, que estavam a favor deles.

A pesquisa revela insatisfação em aumento. No ano em que Dilma ganhou a eleição (2010), havia empate técnico entre satisfeitos (50%) e insatisfeitos (49%). Em 2012, aumentava 10% o nível de insatisfação.

Mas o levantamento mostrava uma aparente contradição: 74% diziam que sua situação financeira era boa, 79% afirmavam que a economia iria melhorar e 79% apostavam em que seus filhos estariam melhor que eles.

Dá até para inverter célebre frase do general Garrastazu Médici, presidente de 1969 a 74, que, após visita ao Nordeste assolado pela seca, decretou: O país vai bem, o povo vai mal.
As pesquisas do Pew permitem dizer que o povo vai bem, mas o país vai mal, não?

A contradição talvez se desfaça quando se colocam fatos que explicam a insatisfação com o país e a satisfação com a situação financeira pessoal. Quando há virtual pleno emprego e renda em aumento (lembre-se que a pesquisa é de 2012, quando a inflação em alta ainda não comia tanto o salário como agora), a maioria sente-se bem.

Mas mesmo quem tem emprego e renda é torturado no cotidiano por um país em que o trânsito é infernal, a violência é aterradora, há eternas carências graves na educação e na saúde, os serviços públicos são precários, para não usar uma palavra feia.

Na verdade, deveria haver espanto não com os protestos de agora mas com o fato de que nunca tenha havido manifestações de massa contra esse massacre cotidiano (as que ocorreram foram por motivos institucionais).

Por que agora, então? Esta pergunta demanda mais tempo de pesquisa para uma resposta minimamente satisfatória. Mas uma pista talvez esteja na pesquisa do Datafolha, ontem publicada, segundo a qual o público perdeu totalmente a confiança em instituições (Congresso e partidos políticos por exemplo) que deveriam fazer a intermediação entre a sociedade e o Estado.

Por isso, partiu para o que a presidente chamou, com razão, de ultrapassagem dos mecanismos tradicionais das instituições, dos partidos políticos, das entidades de classe e da própria mídia.

A questão seguinte, para a qual ainda não há resposta, é se os mecanismos tradicionais saberão se reciclar (duvido) e como o protesto atuará em função da reciclagem ou falta dela.


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