Neste texto o advogado João Francisco Rogowski, destaca um dos tantos problemas que fazem com que o Poder Judiciário tenha perdido sua credibilidade diante dos que necessitam dele, e que muitas vezes, ao aciana-lo, se deparam com decisões descabidas, injustas e de péssima qualidade, senão absurdas.
Questões importantes nas mãos de jovens e inexperientes
estagiários
Por João-Francisco Rogowski, advogado (OAB-RS nº 16.923)
Na pauta das reivindicações das centrais sindicais que
motivou a greve geral de ontem (11) está a regulamentação e limitação da
terceirização. Isso me fez lembrar a questão da estagiariocracia que vem
atormentando aos advogados e causando prejuízos ao interesse público e graves
danos à sociedade, ao funcionalismo público e ao próprio Estado. A situação é
gravíssima e reclama atenção urgente das autoridades.
Minha crítica não se dirige à pessoas especificas nem a essa
ou àquela administração, pois, há décadas que o problema se arrasta e se
verifica nas três esferas de atribuições do Estado aqui entendido como
municípios, Unidades Federativas e União federal, porém, é visível e inconteste
que se agravou por demais nos últimos anos. Percebe-se claramente a
desvirtuação da finalidade do estágio no serviço público.
Por problemas estruturais e financeiros, o Estado encontrou
na lei do estágio uma oportunidade de burlar a constituição e contratar mão de
obra barata sem concurso público, reforçando a tendência já constatada de
exagero na terceirização, delegação e concessão dos serviços públicos, que
atende por um lado os interesses do gestor público, quiçá manietado pela lei de
responsabilidade fiscal.
Como não pode contratar por concurso, então, empurra o
problema com a barriga, e, de outro lado, também atende interesses mais
sombrios que diuturnamente emergem dos escândalos envolvendo fraudulentas
cooperativas de trabalho e empresas terceirizadas, onde poucos estão
enriquecendo a custa do suor de muitos.
O professor Lênio Streck sintetizou muito bem a gravidade e
o perigo da estagioriocracia no âmbito do Poder Judiciário quando disse: “Eles
dão sentenças, fazem acórdãos, pareceres, prendem, soltam, elaboram contratos
de licitação, revisam processos”.
O estagiário não é trabalhador, é estudante e assim tem que
ser tratado e respeitado. E não é só no Judiciário que eles estão em desvio de
finalidade; eles estão em toda parte, no Legislativo, no Executivo, nas
delegacias de polícia.
Embora exercendo atividades burocráticas, não raro em
simetria com os escrivães de polícia, não recebem por mínimo que seja,
treinamento policial como receberam os escrivães; não recebem pagamento por risco
de vida, pois, hodiernamente qualquer dependência policial é um ambiente
potencialmente perigoso.
A Lei do Estágio (nº 11.788/08, art. 17) determina que o
número máximo de estagiários deva ser proporcional ao quadro de pessoal das
entidades concedentes. Todavia, essa determinação vem sendo desrespeitada,
pois, há repartições públicas em que o número de estagiários excede ao de
servidores de carreira.
O que mais interessa à classe dos advogados são as
consequências da estagiariocracia no Judiciário, pois, relembrando as palavras
do professor Streck, os estagiários prolatam sentenças, lavram acórdãos, emitem
pareceres, prendem e soltam etc.
A sociedade paga salários de juízes e desembargadores e
obtem a prestação jurisdicional de leigos, despreparados, sem formação técnica,
inexperientes, que custam ao Estado em média em torno de um a dois salários
mínimos mensais, sem quaisquer garantias e direitos sociais, abrindo todo tipo
de brecha para a corrupção.
A sociedade tem sido muito prejudicada por isso; os
cidadãos, as empresas, enfim, os jurisdicionados de modo geral, submetem às
barras dos tribunais suas questões mais importantes, que tem a ver com a vida
das pessoas, com a liberdade, família, patrimônio, não raro adquirido após uma
vida inteira de trabalho e sacrifícios, e ao fim e ao acabo essas questões
vitais deságuam nas mãos de um jovem e inexperiente estagiário que decidirá a
vida alheia.
Os advogados são testemunhas dos prejuízos irreparáveis que
tem sido acarretados ao povo por essa prática que a meu ver é criminosa.
Perde também o funcionalismo público, pois, os estagiários
acabam ocupando as vagas originalmente destinadas aos servidores de carreira.
Providências devem ser adotadas com urgência, quer seja
quanto à fiscalização do Ministério Público, quanto a alterações na legislação
objetivando por cobro a essas iniquidades.
texto: João-Francisco Rogowski, advogado (OAB-RS nº 16.923)
fonte: Espaço Vital
post: Marcelo ferla
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